Em vez de um código de números (PIN) o Governo português quer que os cidadãos possam usar o reconhecimento facial para se autenticarem no serviço Chave Móvel Digital, que já é obrigatório no acesso ao portal do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e que pode ser usado também para aceder a muitos outros serviços públicos, como as finanças, e assinar documentos eletrónicos.
O concurso público para adquirir a solução que permita esta integração foi lançado em dezembro e as candidaturas estão ainda a ser avaliadas pela Agência da Modernização Administrativa (AMA). O valor do contrato é de 150 mil euros e o prazo de execução é de três anos, período durante o qual o novo sistema, a avançar, deverá estar implementado na Chave Móvel Digital.
Com a integração do reconhecimento facial a aplicação do CMD deverá comparar a imagem recolhida no momento pela câmara do telemóvel com a fotografia registada no Cartão de Cidadão, como tinha avançado a Visão já no início do mês, referindo também existem dúvidas sobre a segurança deste tipo de tecnologia. Este fim de semana o jornal Público voltou a pegar no tema e adianta algumas especificações, como a utilização da tecnologia de liveness, que é capaz de “detetar vida” e perceber se a imagem a validar é de uma pessoa real e não de uma fotografia.
Os últimos números divulgados indicavam que mais de 1 milhão de cidadãos já tinha feito registo da Chave Móvel Digital. No site Autenticação.gov os dados apontam para 1,189 milhões de registos, e mais de 824 mil CMD ativas, o que equivale a 12% da população ativa, mas as queixas sobre a complexidade do serviço e o esquecimento do código PIN são entraves na utilização da ferramenta que foi criada como alternativa à utilização do sistema de autenticação do Cartão de Cidadão no acesso a serviços online.
O acesso ao Portal das Finanças, a marcação de consultas online e o pedido de certidões e do registo criminal, e são alguns dos serviços que podem ser utilizados com a Chave Móvel Digital, ou o Cartão de Cidadão, mas há também serviços de entidades privadas que aceitam já este modo de autenticação, incluindo bancos como a Caixa Geral de Depósitos, o Millennium BCP, Novo Banco e o Activobanke, a outras empresas como a EDP Comercial.
CNPD tem "reservas" sobre o projeto
Filipa Calvão, presidente da Comissão Nacional de Proteção de Dados, confirmou ao SAPO TEK que esta medida está a ser analisada pelo regulador de proteção de dados, e que tem "reservas" sobre este sistema. "Temos dúvidas em relação ao modo como essa tecnologia está a ser utilizada", explica em entrevista.
Apesar de grande parte dos smartphones de gama média e de topo de gama já usarem o reconhecimento facial como sistema de autenticação, em substituição do PIN, a presidente da CNPD lembra que é preciso perceber se o cidadão está suficientemente informado sobre o que isso significa, apesar de já estar assente no consentimento do utilizador, ao contrário da utilização da videovigilância com reconhecimento facial no espaço público.
Filipa Calvão refere ainda a questão da proporcionalidade da medida. "O que é que isso significa, que informação é que fica do lado do Estado, porque não é só do reconhecimento facial, há outra informação associada, que medidas de segurança que há", refere, não pondo em causa a finalidade que a medida tem em vista e que é facilitar a vida aos cidadãos na autenticação. "Temos de ver se tudo o resto está garantido", afirma.
"Nunca podemos dizer que as coisas estão completamente blindadas, mas quando estamos a falar de reconhecimento facial tem de estar muito próximo, porque o risco de usurpação de identidade, e a vontade de certas pessoas acederem a essa informação para se fazerem passar por outras e celebrar todo o tipo de contratos com base nessa informação, vai ser muito grande [...] isso é um tipo de informação que é apelativo", refere.
A presidente da CNPD admite também que o Estado já tem esta base de dados mas que este sistema cria novos mecanismos e processos de acesso e transmissão a essa informação e por isso temos de ter especiais cuidados com isso.
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