Por Francisco Jerónimo (*)
Os anos 70 foram prolíficos na previsão tecnológica que um dia viria a fazer parte das nossas vidas. Entre 1975 e 1977, a série televisiva ‘Espaço: 1999’ (transmitida pela RTP nos anos 80) trouxe uma visão sobre as comunicações móveis e, já em 1968, um filme icónico de Stanley Kubrick – ‘2001: Odisseia no Espaço’ – demonstrou como iríamos interagir com Inteligência Artificial (IA). No filme, o HAL 9000, um computador com personalidade e capacidade de pensamento, comunicava com o protagonista como se de outro adulto se tratasse. Ambas as produções de ficção científica tornaram-se lendárias, e recordo bem como estas tecnologias fizeram parte das minhas brincadeiras de infância.
Passados muitos anos, e já no final do século XX, ainda estávamos longe da tecnologia utilizada no cinema e televisão, mas duas revoluções estavam prestes a iniciar-se. Nessa altura, iniciava a minha carreira no departamento de R&D da Nokia, no Japão, e lembro-me bem das conversas com engenheiros e analistas da empresa, onde discutíamos como o telemóvel viria a substituir muitos dos aparelhos que na altura eram banais – a câmara fotográfica, o rádio, a televisão, o leitor de música, as consolas de jogos ou os blocos de notas.
Nos últimos 25 anos, tive o privilégio de assistir às duas maiores revoluções tecnológicas na área dos dispositivos móveis. A primeira iniciou-se nos anos 70 (com a criação do primeiro telemóvel), mas teve o seu pico de crescimento nos anos 90, com a massificação dos telemóveis. Estes terminais revolucionaram a forma como comunicávamos. Nas décadas seguintes, assistimos à proliferação dos smartphones, que transformaram todos os outros aspetos das nossas vidas. Hoje, cerca de 70% da população mundial possui um smartphone.
Embora ambas tenham sido marcantes, a revolução da IA, iniciada em 2024 na área dos dispositivos móveis (incluindo smartphones, tablets e PCs), promete ser mais fascinante e profunda. As principais marcas de smartphones, PCs e tablets lançaram, no ano passado, os primeiros produtos com IA através da integração de GenAI – a tecnologia que chegou às nossas mãos com o ChatGPT.
Na IDC, para além de acompanharmos a adoção destas tecnologias, também analisamos o futuro e avaliamos como será a sua evolução. Em 2024, foram vendidos 225 milhões de smartphones com IA e a IDC estima que as vendas continuem a crescer a uma média de 43% ao ano até 2028. O mesmo se verifica nos PCs, onde prevemos que 56% dos computadores vendidos em 2028 terão funcionalidades semelhantes. As vendas conjuntas destas categorias atingirão os 484 mil milhões de dólares em 2028.
Se 2024 trouxe para as nossas mãos a realidade da ficção científica de há 50 anos, 2025 e os anos seguintes trarão o início de uma realidade que poucos ou nenhuns filmes de ficção científica foram ainda capazes de prever. A velocidade com que a IA está a ser explorada e integrada em todos os aspetos dos produtos e serviços das grandes marcas permite-nos antecipar que esta não é apenas uma tecnologia efémera, mas uma inovação que mudará as nossas vidas de uma forma incomparável a qualquer desenvolvimento tecnológico anterior.
Embora seja impossível prever em detalhe o impacto da IA nas nossas vidas (tal como ninguém previu a importância do telemóvel na humanidade), podemos tentar antecipar cenários paradigmáticos. Nos últimos 100 anos, assistimos à automação da “execução”. Muitas tarefas manuais foram automatizadas, sendo hoje executadas por robots ou computadores. Profissões baseadas em trabalho manual repetitivo tornaram-se irrelevantes ou desapareceram. Com a IA, estamos agora a assistir à automação das tarefas intelectuais. Ferramentas como o ChatGPT permitem criar conteúdo de forma inimaginável há poucos anos. Se até agora vivemos a automação da “execução”, nos próximos anos testemunharemos a automação do “pensamento e criação intelectual”.
Em 2025 assistiremos a uma nova revolução tecnológica que nos próximos anos “explodirá” nas nossas mãos através da “inteligência” que está a ser desenvolvida para os dispositivos móveis. Entre as principais previsões destaco os seguintes desenvolvimentos que podemos esperar nos próximos anos:
- Assistentes virtuais pessoais inteligentes dominantes nos dispositivos móveis – Em 2025, a IDC estima que os smartphones com IA cresçam 85% face a 2024. As funcionalidades de IA deixarão de ser exclusivas dos topos de gama e passarão a estar acessíveis nos dispositivos de média e baixa gama. Os assistentes pessoais inteligentes terão a capacidade de analisar toda a informação disponível nos smartphones (emails, localização, mensagens, fotos, contatos, calendário, notas, etc.) e responder a questões complexas do nosso quotidiano, dar sugestões e alertas contextuais, agendar compromissos, responder a emails e criar relatórios complexos apenas com comandos de voz.
- Agentes de IA que iniciam e executam tarefas sem intervenção do utilizador – A IA disponível nos dispositivos móveis será composta por vários agentes de IA que terão capacidades e funções especializadas. Estes agentes terão a capacidade de analisar dados complexos e executar tarefas específicas sem a necessidade de intervenção do utilizador.
- Tradução instantânea e comunicação global sem barreiras – A tradução em tempo real durante chamadas telefónicas ou conversas será comum, bem como a criação de conteúdo em qualquer língua, facilitando interações globais e impulsionando o turismo e o comércio internacional.
- Dispositivos móveis vitais na monitorização de saúde – Smartphones e wearables monitorizarão sinais vitais, alertarão para problemas e sugerirão ações corretivas ajustadas ao utilizador ou encaminharão para a consulta médica adequada.
- Expansão da realidade aumentada – Óculos inteligentes e outros dispositivos substituirão ecrãs físicos por imagens virtuais projetadas diretamente nas lentes.
Embora algumas destas previsões pareçam ficção científica, como analista, já vi estas funcionalidades em teste, pelo que a Odisseia da IA nos dispositivos móveis será uma realidade para muito breve.
(*) VP for Data and Analytics na IDC EMEA
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