
Por Daniela Antão (*)
Há uma indústria que em 2024 valia 92,5 mil milhões de dólares e se prevê valer 1,9 triliões de dólares em 2032, crescendo a uma taxa anual composta de 39%. Falo da XR, ou extended reality: designação genérica que abrange as três noções de realidade - virtual, aumentada e mista. Estas três tecnologias imersivas são criações da disciplina científica de spatial computing e suas aplicações tecnológicas.
Possivelmente, a única indústria digital em que a Europa compete taco-a-taco com os EUA, com 28% de quota mundial contra 35% do berço da economia digital, segundo as boas notícias do relatório Portugal XR Report 2024.
“Early adopters” empresariais
Enquanto uma certa corrente de opinião vaticinava o fim da febre do metaverso, o mercado empresarial tomou a dianteira da curva de adoção das tecnologias XR. Cerca de três quartos deste mercado é dinamizado pelas aplicações empresariais ou institucionais. Podem ser cirurgias de remoção de tumores com realidade aumentada em que o cirurgião usa óculos XR; simulações imersivas de laboratório, para o ensino ou para o treino de resposta a catástrofes naturais pela proteção civil. Mas podem ser formatos de experiência do utilizador no turismo, no imobiliário ou nos bens culturais e históricos, como a digitalização em 3D da Torre Gregoriana ou uma viagem imersiva num quadro de Salvador Dali.
Mutação tecnológica
Os «content builders» são o talento-estrela da edição USA 2025 da Augmented World Expo, a AWE (que é “uma Web Summit” da XR; e Ori Inbar é “o Paddy Cosgrave da AWE”).
Ori Inbar é contundente: afirma que a IA está com falta de dados para treinar os algoritmos e que, por isso, precisa da XR. Segundo ele, a XR está a tornar-se mainstream. A questão é mais complexa: a IA permite expandir os horizontes da realidade aumentada porque fornece a capacidade para a computação espacial criar as realidades virtuais em tempo real. Essa capacidade tem catapultado o desenvolvimento de formados XR. Por sua vez, a massa crítica de dados gerada no uso dos mundos virtuais fornece informação para o treino dos algoritmos da IA.
Realmente, ainda agora “acabámos de chegar” à web 3.0 e já estamos a entrar na web 4.0. Em jeito de resenha… A web estática (1.0) estabelecia comunicação unidirecional com os internautas. A web participativa (2.0) permitiu aos utilizadores interagir com os fornecedores de conteúdos e entre si. A web semântica (3.0) é aberta, descentralizada e permite transações peer-to-peer, transitar entre aplicações, ou a interligação de dados entre plataformas ou aplicações. A web simbiótica (4.0) utiliza IA, a Internet das Coisas, transações em blockchain, mundos virtuais, capacidades de realidade aumentada, ativos físicos e digitais plenamente integrados em comunicação entre si, permitindo experiências imersivas e fundindo os mundos físico e digital.
800 mil milhões em fundos europeus
Num mercado heterogéneo, em que os Giant Tech convivem com uma profusão de pequenas empresas e start-ups, a Europa desenhou uma estratégia e orçamentou 8,1 mil milhões de euros de investimento.
O modelo europeu de investimento em XR - uma espécie de “rebranding” do metaverso – assenta na criação de consórcios entre, pelo menos, três Estados-membros. São os EDIC’s (European Digital Infrastructure Consortium).
Por exemplo, a iniciativa dos gémeos digitais humanos, os VHT – Virtual Human Twins, visa estimular a investigação e desenvolvimento na saúde. O citiverse é um consórcio EDIC de que Portugal é membro fundador, para a criação de gémeos digitais das cidades. O imenso potencial do citiverse foi “codificado” numa taxonomia por iniciativa da União Internacional das Telecomunicações (Nações Unidas).
Tal como não podemos imaginar o mundo físico organizado sem nomes e cartão de cidadão com um número de identificação civil, nesta fusão de mundos, a identidade digital é crucial para a titularidade e o exercício de direitos, ou para a responsabilização por atos ilícitos, nos mundos virtuais. Trata-se de criar um misto dinâmico de dados, avatares, aparelhos e credenciais. O consórcio Digital Identity Wallet está neste trilho.
A realidade vista com outros olhos
Nos 25% de mercado ocupados diretamente pelos consumidores, a Gen Z e os millenials são os grandes motores de adoção da XR. A Apple exaltou o mercado no ano passado com os seus óculos virtuais Apple Vision Pro, de três mil e quinhentos dólares. Sob críticas de que são caros e pesados para funcionalidades limitadas, seis meses depois, a novidade da Apple parece ter perdido entusiasmo, e os óculos virtuais da Meta continuam a liderar uma renhida corrida.
Já o seu próximo tecnológico, os smart glasses, tiveram encomendas de 2 milhões em 2024, com uma variação anual de 210%, impulsionada pela popularidade dos Ray-Ban-Meta. Este mês, a Google apresentou o seu protótipo, sob efusivas ovações do público especializado, num bonito auditório ao ar livre.
Se as redes sociais desencadeiam sérias preocupações acerca da saúde mental, da adição, da desinformação, manipulação e vigilância, o uso de aparelhos imersivos que captam dados biométricos, impulsos nervosos, movimento ocular, e milhões de rostos com câmaras a apontar para a via pública elevam exponencialmente os riscos sobre a integridade e autonomia dos utilizadores e a privacidade dos observados.
Portugal, West Coast Techpreneur
Há uma massa crítica de talento que cresce em Portugal de entrepreneurs, sciencepreneurs e techpreneurs. É legítimo Portugal ambicionar ser a XR-West Coast da Europa, fazendo justiça ao cântico de Camões, onde a terra se acaba e o mar começa.
XR e web 4.0 são um dos debates mais prementes a fazer: pelo seu valor económico, pelo talento qualificado da comunidade, pelo seu impacto social.
(*) Doutoranda Candidata NOVA School of Law, Investigadora NOVA Data-Driven Law Knowledge Centre, Bolseira Whatnext.law e Moderadora Portugal nos Mundos Virtuais
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