Por Vital Domingos Teresa (*)

O “apagão” de 28 de abril veio uma vez mais pôr à prova as capacidades da comunicação de emergência em Portugal. Na coordenação desta crise, ficou mais uma vez patente a importância de mitigar a dependência da infraestrutura terrestre. As conclusões sobre o funcionamento do SIRESP (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal) deverão agora ser usadas na sua reformulação e na relação com as iniciativas europeias sobre ao desafio de comunicações seguras por satélite.

O SIRESP é a rede nacional dedicada a comunicações críticas. Usado por forças de segurança, proteção civil, forças armadas, entre outros, conta com cerca de 550 estações-base, centros de despacho e unidades móveis. Embora desde 2017 tenham sido feitos investimentos em redundância via satélite, o incidente do “apagão” evidenciou que a rede ainda é vulnerável.

Como resposta, o governo criou um grupo de trabalho com representantes de várias entidades (ANACOM, ANEPC, CNCS, GNS, GNR, PSP, INEM, entre outros) para apresentar, em 90 dias, um estudo técnico-estratégico sobre a reformulação ou substituição do SIRESP.

Soberania e complexidades nas comunicações por satélite atuais

Existem múltiplos sistemas disponíveis, com vantagens e desvantagens como a rede Starlink. O acesso simples a esta rede de 7000 satélites tornou-a uma pedra basilar das operações no conflito na Ucrânia, mas não sendo europeia, não dá garantias absolutas de continuidade. Uma recente troca pública de galhardetes entre o dono desta rede - Elon Musk - e o seu cliente - o Ministro dos Negócios Estrangeiros Polaco Radosław Sikorski - fez temer o pior. Já as operadoras europeias como Eutelsat, SES ou Hispasat mitigam preocupações de soberania, mas oferecem menor agilidade, capacidade, e facilidade de acesso. A acrescentar a estas empresas privadas, alguns estados europeus, como é o caso de Itália, Alemanha, França e Espanha, detêm satélites de comunicações governamentais. No entanto, a partilha segura destes recursos é um tema técnica e politicamente complexo.

A resposta europeia – GOVSATCOM Hub

Um elemento central da resposta da União Europeia a este desafio é o GOVSATCOM Hub, uma plataforma que funciona como centro operacional ligando entidades públicas aos serviços de comunicações por satélite, de forma segura e integrada. Na prática, o Hub funcionará como um ponto único de acesso em que entidades como proteção civil podem comparar opções, interpretá-las e reservá-las num catálogo harmonizado, mas também identificar necessidades específicas a ser supridas.

A Agência da UE para o Programa Espacial (EUSPA) confiou à empresa GMV a liderança de um consórcio para conceber esta plataforma. As nossas equipas estão desde 2024 a engajar instituições portuguesas em todo o território para desenhar um mapa de requisitos e necessidades dos futuros utilizadores civis e militares.

O sistema faz uso das infraestruturas já existentes, mas será reforçado até 2030 com 300 satélites do programa IRIS². A entrada em operação está prevista para junho, estando apenas pendente a acreditação de segurança a cargo do Conselho de Acreditação de Segurança europeu, com a participação do Gabinete Nacional de Segurança (GNS). Este, por sua vez, distribuirá créditos de acesso ajustados às necessidades das entidades nacionais.

Este é o momento ideal para abordar a integração do GOVSATCOM com os sistemas de comunicações nacionais. No sentido inverso o presente grupo de trabalho tem oportunidade privilegiada para fazer as conclusões grupo de trabalho informar e moldar o programa Europeu, para melhor lhe permitir reforçar a resiliência das comunicações de emergência em Portugal, mitigar vulnerabilidades e elevar a capacidade de resposta a crises futuras.

(*) Coordenador de Institutional Ground Segment (INGS) na GMV em Portugal