Os números não enganam na avaliação daquilo que é uma perceção generalizada. Em Portugal as mulheres especialistas em Tecnologias de Informação e Comunicação representam apenas 16% do total das pessoas empregadas nesta área e só 19% das diplomadas em tecnologias de informação e comunicação. Os dados do Índice da Igualdade de Género de 2020 do EIGE (Instituto Europeu para a Igualdade de Género) mostram que Portugal está a progredir mais rapidamente do que a média europeia para a igualdade do género, mas que ainda persistem uma segregação sexual na educação e profissões ligadas às áreas científicas e tecnológicas, e no mercado identificam-se também muitas barreiras à progressão das carreiras.
“Sabemos o gap que existe nestas áreas tecnológicas e na ciência em geral. Temos bons valores no global em termos de mulheres na investigação científica e na produção de conhecimento. A questão é que existe uma invisibilidade tremenda no contributo das mulheres nestes domínios porque se associou à área do saber e à ciência aplicada como qualquer coisa de masculino” sublinha Rosa Monteiro, Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, reconhecendo porém que “Portugal não está assim tão mal quando comparado com a média europeia”.
Os bons exemplos existem e estão em várias áreas, da cientista Elvira Fortunato à empreendedora Daniela Braga, entre muitas outras que podiam ser referidas. Nos últimos anos temos também assistido a um maior número de mulheres na direção de grandes empresas tecnológicas em Portugal, algumas multinacionais, e Paula Panarra da Microsoft, Sofia Tenreiro que esteve vários anos na Cisco ou Célia Reis na Altran, são alguns dos nomes que podem ser citados.
O que falta é generalizar estes bons exemplos e conseguir um maior número de mulheres na ciência e na tecnologia, nos vários níveis de direção e liderança das organizações, uma meta de maior paridade que tem vindo a ser promovida em várias iniciativas públicas e privadas. A Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação 2018-2030, “Portugal + Igual”, colocou no terreno várias medidas de promoção da igualdade, também nas áreas de ciência e tecnologia, que integram a nova estratégia do InCoDe.2030.
“Temos um grande objetivo de combater a segregação sexual nas profissões. São construções sociais, enraizadas, que dão origem a problemas como a desigualdade salarial, social e carências no mercado de trabalho”, admite Rosa Monteiro.
A secretária de Estado lembra que em 2009 tivemos um pico de descida do número de diplomadas nas áreas científicas pata 17,9% quando tinha sido em 1999 de 26%, “uma redução brutal que exigia uma intervenção” e por isso foi decidido avançar em 2017 com o programa Engenheiras por um dia, que já chegou a mais de 10 mil jovens dos ensinos básico e secundário, em 460 atividades, entre práticas laboratoriais, sessões de role model e mentoria.
“Este número vai ainda escalar. Há muitas universidades a desenvolver iniciativas específicas no âmbito do STEAM com programas apoiados pelo PRR”, explica a secretária de Estado.
Segundo a governante, foi criada “uma grande rede” de entidades envolvidas na promoção do desenvolvimento de competências digitais e promoção de carreiras nas áreas de ciência e tecnologia que se materializou no final do ano passado na Aliança para a Igualdade nas TIC, que começou com cerca de 100 entidades e já conta com 135 parceiros, entre os quais a Huawei e a Cisco.
“O grande sonho de uma política pública é que consiga consolidar-se no terreno”, justifica, mostrando a satisfação com a forma como a Aliança tem crescido com a adesão de mais empresas que desenvolvem as suas próprias iniciativas para promoção da igualdade.
Para Rosa Monteiro, este “é um trabalho muito profundo, sustentável, estruturante e deve fazer parte de todas as medidas para a transição digital”.
Procura-se mais mulheres para as TIC
A necessidade de mais profissionais nas áreas das Tecnologias da Informação e Comunicação está identificada com a Europa a estimar que são precisos mais de 900 mil novos profissionais para suportar o desenvolvimento da economia do conhecimento. Para estas metas é essencial que as mulheres façam parte destes números de forma a atingir o crescimento desejado.
As várias análises revelam que para isso é preciso estimular desde cedo a adesão das meninas e raparigas a programas mais ligados à ciência e tecnologia. “Temos de trabalhar na área da educação para formar mais raparigas e mulheres nesta área”, defende Luisa Ribeiro Lopes, apontando as medidas desenvolvidas nos programas UpSkill e no impulso jovem STEAM.
As medidas de promoção de igualdade de género estão agora assumidas de forma transversal no InCoDe.2030, depois da reformulação do programa no ano passado, como explicou ao SAPO TEK , coordenadora do programa.
“O que queremos é mostrar a possibilidade de escolha e educar para a escolha”, sublinha Luisa Ribeiro Lopes, admitindo que muitas raparigas nem sequer pensam numa carreira nesta área.
Para a coordenadora do InCoDe.2030, uma política de quotas poderia ter efeitos favoráveis, já que estas medidas “vieram provar que são a melhor forma de impulsionar efetivamente a paridade de género”.
Apesar de ambiciosas, Rosa Monteiro está confiante de que as metas que foram colocadas são exequíveis. “São objetivos e metas concretas. Temos de passar a mensagem de forma positiva”, afirma, defendendo que tem uma visão pragmática e que o otimismo “resulta de muito trabalho”.
“Não estaríamos hoje com tudo a acontecer se não tivéssemos trabalhado para isso […] o otimismo é motor para a ação”, acrescenta. Mesmo assim alerta que este é um trabalho que tem de ser mantido na continuidade. “Tem de se continuar a trabalhar de forma estruturada e em rede, em todos os patamares”, lembrando que estamos em contextos adversos em que há até ataques a estas áreas vindos de setores políticos mais conservadores.
“O retrocesso é uma certeza se houver paragem na ação e no investimento”, afirma Rosa Monteiro.
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