Num mundo onde as Big Tech têm milhares de milhões de euros para investir em Inteligência Artificial, o que pode ser feito nas empresas e centros de investigação em Portugal para explorar oportunidades e manter inovação? Esta é uma das perguntas que atravessaram vários momentos de debate do 33º Congresso da APDC, que decorre nos dias 14 e 15 de maio em Lisboa e que pode ser acompanhado online.

A necessidade de investimento para garantir ferramentas e recursos humanos para a estratégia de IA, Dados e Web 3 já tinha sido sublinhada por Arlindo de Oliveira e os coordenadores dos documentos estratégicos que foram entregues ao Governo. Mas a ideia voltou a ser um dos pontos chave da discussão no debate dos projetos apoiados pelo PRR, com o Centro para a IA responsável e o consórcio Accelerat.ai.

Paulo Dimas, vice presidente de inovação da Unbabel, e responsável pelo Centro de IA responsável, diz que “temos grupos de investigação brilhantes” e muito talento de linguagem natural em Portugal, que é um dos centros mais avançados no desenvolvimento desta área no mundo. A ideia é que possam desenvolver-se projetos estimulantes para reter esse talento, e é nisso que o Centro, que é financiado pelo PRR, está a trabalhar, envolvendo 22 parceiros, startups e centros de inovação. Mas o especialista avisa que “temos de ser rápidos”.

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Também Sebastião Villax, responsável de inovação, parcerias e alianças Defined.ai, e representante do consórcio Accelerat.ai, destaca a necessidade de atrair e reter talento, que só pode ser feito com inovação. Lembrando que desenvolver um grande modelo de linguagem é caríssimo, o objetivo do consórcio é construir um modelo de conversação de IA em português de Portugal, usando dados recolhidos em Portugal e para isso contam com a parceria da NOS.

Os modelos em língua portuguesa europeia foram identificados como uma lacuna do mercado já que os grandes modelos têm sobretudo o português do Brasil, dada a dimensão, mas Paulo Dimas sublinha a necessidade de proteger a língua, até por uma questão de soberania geopolítica, lembrando que os espanhóis anunciaram recentemente que em junho vão ter um modelo de linguagem de grande escala para as várias línguas faladas em Espanha e nos países da chamada América Latina.

A questão da infraestrutura e Deucalion sem GPUs para IA

Para manter a inovação “é preciso haver infraestrutura de IA”, defende Paulo Dimas, que explica que a FCT tem uma estratégia bem definida e que o Centro de IA responsável está a trabalhar com a fundação, mas que o supercomputador que foi adquirido, o Deucalion não tem os GPUs para treinar os modelos de IA. “Temos de aumentar a capacidade computacional”, justifica, adiantando que há uma parceria para a utilização do supercomputador de Barcelona, em que Portugal tem acesso a 5%, o que não é muito.

“Com este supercomputador íamos demorar 3 anos a treinar o ChatGPT. E só temos 5%”, justifica Paulo Dimas.

E se não podemos competir em supercomputação e treino de grandes modelos, onde pode Portugal fazer a diferença? Para Paulo Dimas a resposta está nos dados, e dá o exemplo dos dados de saúde onde o Centro já está a trabalhar com dois Hospitais. “A maior parte dos dados são treinados nos Estados Unidos”, explica. A Europa está a avançar com o European Health Data mas “Portugal não pode esperar, temos de nos posicionar na vanguarda nestas áreas e não custa o mesmo que os 100 milhões que oram usados para treinar o ChatGPT”, destaca.

Projetos em curso mas em diferentes fases de maturidade

No painel de discussão sobre o impacto da IA nas grandes indústrias, a CGD, e-redes, Glintt e AgentifAI partilharam algumas das experiências de desenvolvimento de estratégias de IA nas organizações e a forma como está a ser usado para melhorar processos.

No caso da CGD, Francesco Costigliola, Chief Analytics Officer, diz que a IA é olhada como um argumento estratégico para melhorar o serviço ao cliente, melhorando o acesso à informação e comunicação com o cliente. Mas que nos vários casos ajuda a reduzir tarefas de análise sem substituir o humano no processo de decisão.

Do lado da e-Redes, João Martins de Carvalho destaca a capacidade de sensorização que pode ser potenciada pela IA, enquanto a Glintt está a potenciar internamente a tecnologia mas também a colocar um centro de excelência ao serviço dos clientes, como explica Miguel Leocádio, membro executivo do Conselho de Administração. Rui Lopes, CEO, AgentifAI, destacou também os projetos da empresa que está a testar novas áreas da sua plataforma conversacional com um grande cliente em Espanha, que não identificou.

Regulação positiva ou negativa para desenvolvimento da IA?

O AI Act, que já foi aprovado pelo Parlamento Europeu e aguarda agora luz verde do Conselho, foi analisado no painel REGULATION OF AI APPLICATIONS com Maria Manuel Leitão Marques, membro do Parlamento Europeu, e Clara Martins Pereira, professora assistente na Durham Law School.

A Eurodeputada lembrou que o regulamento estava a ser trabalhado no Parlamento Europeu e que o objetivo é proteger os cidadãos dos riscos, como a possibilidade de ser excluído de um emprego pela análise de um algoritmo, ou parado no metro por suspeitas de ser um criminoso, mas que foi acautelado o equilíbrio entre aproveitar oportunidades e prevenir certos riscos.

Admite que é um documento complexo, com quase 500 páginas, mas que a evolução da tecnologia traz também um desafio aos reguladores. Com o anúncio do ChatGPT da OpenAI teve de ser adicionado um novo capítulo.

“Porque a tecnologia muda muito, o regulamento está feito com alguma arte em matéria de flexibilidade. Remetendo para atos de implementação ou atos delegados, que são mais fáceis de aprovar. Queremos inovação em que possamos confiar, com aplicações que sejam confiáveis”, afirma Maria Manuel Leitão Marques.

Lembra ainda que nos habituámos a pensar que o mundo digital não precisa de regras, mas que estas são importantes, e defende que devia existir uma sintonia de adoção dos princípios éticos e regulatórios nos vários países democráticos.

Nesta linha, Clara Martins Pereira, adnite que a China poderá ainda regular a IA antes dos Estados Unidos, mas que existe uma procura de equilíbrio entre a segurança e a inovação nas várias iniciativas dos reguladores.

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