A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias realizou no início de novembro uma audição conjunta com as entidades que estão a contribuir para a evolução da proposta de lei 246/XII – também conhecido como a lei da cópia privada. Enquanto a classe política trata do documento oficial, outras pessoas continuam a discutir os benefícios e malefícios da dita revisão legislativa.

Hoje, 25 de novembro, em Lisboa, um evento reuniu algumas personalidades que têm vindo a acompanhar a questão da cópia privada. Apesar de o tema do debate ter sido Como potenciar velhos negócios nas novas plataformas?, as participações andaram sempre em torno da taxa que pode vir a ser aplicada a smartphones, tablets, cartões de memória e outros equipamentos com armazenamento interno.

E houve um ponto em que a maioria dos oradores convergiu: a proposta de lei da cópia privada ainda não foi sequer aprovada e posta em prática e já está a ficar desatualizada, datada, sem validade e distante dos novos modelos de consumo.

O deputado Michael Seufert, do CDS-PP, foi um dos que se mostrou conformado com esta realidade: “Concordo quando se diz que os deputados de alguma maneira estão a discutir questões ultrapassadas, acho que isso é relativamente evidente”. O elemento da banca parlamentar defendeu no entanto que as taxas que estão em discussão não são “excêntricas”, quando comparadas com os impostos que existem noutros países onde há uma lei da cópia privada.

Mas a primeira pessoa a tocar no ponto de que o que está a ser discutido são “velhas notícias” foi o professor Mário Silva, do Instituto Superior Técnico, que revelou alguns números que comprovam o cada vez maior crescimento dos serviços de streaming e que mostram até que cada vez mais utilizadores subscrevem as versões premium. “Quando a proposta de lei for aprovada, já a lei estará desatualizada”, vaticinou o académico.

Também o professor universitário e antigo empreendedor na área das telecomunicações Pedro Carlos defendeu que a cópia privada está em extinção. Não só por causa das novas formas de consumir música e filmes, como também pelo facto de cada vez mais o armazenamento ser feito em equipamentos do dia a dia e não em periféricos como CDs ou DVDs. “Ver alguém comprar em digital para gravar num CD é algo virtualmente inexistente”, argumentou o investigador.

Pedro Carlos lembrou que até a compra de música digital, em serviços como o iTunes, está a cair em desuso, pelo que será uma questão de tempo até que as leis da cópia privada desapareçam.

O diretor-geral da Associação Empresarial dos Sectores Elétrico, Eletrodoméstico, Fotográfico e Eletrónico, José Valverde, foi outro elemento que afirmou que a cópia privada “tende realmente a desaparecer”. Mas o diretor da entidade que representa as empresas do sector tecnológico mostrou outros dados relevantes: caso a proposta de lei seja aprovada, até 2017 pode render cerca de 80 milhões de euros, sendo que só no último ano já serão arrecadados 39 milhões de euros – devido sobretudo à crescente venda de tablets e smartphones.

Estes valores têm por base projeções da IDC no que diz respeito à venda de eletrónica e podem muito bem tornar-se uma realidade. O deputado Michael Seufert, do CDS-PP, disse ter “poucas dúvidas de que a proposta de lei seja aprovada”, isto porque não tem havido muita mobilização. “Não há incentivo dos grupos parlamentares para uma guerra neste tema”, concluiu.

O modelo da lei da cópia privada espanhol – em que o dinheiro que compensa os autores está incluído no Orçamento de Estado – acabou por ser referido mais do que uma vez sobretudo pela defesa e pelo investimento que faz na cultura nacional do país. O professor Mário Silva chegou mesmo a sugerir que se criasse “um serviço de streaming para a cultura portuguesa”, para que houvesse um apoio mais dedicado aos artistas.

Mais dois apontamentos sobre a cópia privada

A pirataria voltou a ser um tema que intrometeu-se na conversa sobre a cópia privada. E para o diretor da angulo sólido, Gustavo Homem, é assim que deve ser feito, caso contrário “a questão não está a ser honestamente abordada”. E o facto de algumas pessoas continuarem a querer separar pirataria de cópia privada apenas vai contribuir para a cada vez maior polarização sobre o tema: ou as pessoas aderem a serviços pagos ou vão passar a “descarregar” tudo de graça da Internet, defendeu.

Outra questão que apesar de nunca ganhar grande destaque, mas que acaba por ser fulcral, é o dos sistemas de proteção contra cópias piratas/privadas – os chamados DRMs.

O presidente da Associação Nacional de Software Livre (ANSOL), Rui Seabra, explicou que é extremamente difícil para um consumidor que compra um DVD ou Blu-Ray fazer uma cópia privada do mesmo por não conseguir contornar as barreiras tecnológicas de proteção. José Valverde da AGEFE também já tinha defendido o mesmo, dizendo que as pessoas vão acabar por pagar mais pelos equipamentos de eletrónica, mesmo quando dificilmente os vão usar para fazer cópias privadas de filmes e até músicas.

Rui da Rocha Ferreira


Escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico

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