O Regulamento de Serviços Digitais (DSA na sigla em inglês) entrou em vigor a 17 de fevereiro deste ano e em Portugal a ANACOM foi designada como autoridade competente para a supervisão do Regulamento dos Serviços Digitais em Portugal, em conjunto com a ERC e o IGAC, sendo a entidade coordenadora. Os primeiros passos já foram dados com a entrega do relatório do Grupo de Trabalho ao Governo, com a identificação de necessidades de alteração legal ou regulamentar e também das 32 autoridades nacionais que se juntaram ao ecossistema.

"Este é um desafio muito grande e muito diferente de qualquer outro tipo de realidade e coordenação, não só com outros coordenadores mas também dentro do país com outras entidades [...] abre portas a um trabalho conjunto e transversalidade que nunca foi visto antes", sublinhou a presidente da ANACOM, Sandra Maximiano, num encontro com jornalistas sobre o regulamento.

A ANACOM teve 90 dias para apresentar uma proposta de modelo de financiamento, modelo de execução, e um parecer sobre a atribuição das entidades competentes em Portugal, o que foi feito a 30 de maio no relatório final, o que Luis Alexandre Correia,  Diretor-Geral Adjunto da Direção-Geral da Informação e Inovação da ANACOM e presidente do Grupo de Trabalho, afirma que foi um trabalho intenso, até porque além da coordenação com as entidades internacionais há ainda "mais relevante a coordenação interna".

"Acreditamos que é o futuro e que necessitamos de uma rede, de criar pontes na aplicação do regulamento, porque muita da investigação caberá a estas entidades", sublinha Luis Alexandre Correia.

Para já a ANACOM recebeu 12 queixas contra entidades internacionais como a Temu e a Meta, mas também a entidades nacionais, neste caso o Portal da Queixa, que estão a ser analisadas. A possibilidade do consumidor reclamar é um dos princípios da DSA, com maior transparência, e Sandra Maximiano refere que o baixo número de queixas ainda está relacionado com a falta do conhecimento, mas que é importante ter esta possibilidade.

Contactado pelo SAPO TEK, o Portal da Queixa diz que desconhece ainda os contornos da queixa que foi apresentada. "Estando na sua génese a democratização da reclamação, como veículo para a melhoria contínua das organizações e a evolução da sociedade, incentivamos e aceitamos de forma totalmente natural a existência de queixas, igualmente, relativas ao nosso serviço prestado, ou não seríamos quem somos", explica o fundador do projeto, Pedro Lourenço.

"No caso em apreço, desconhecendo ainda os contornos que motivaram a insatisfação, estaremos certamente disponíveis para auxiliar os intervenientes a alcançar o esclarecimento necessário, tal como o fazemos a milhares de consumidores diariamente", sublinha, adiantando que "estando conscientes dos desafios tecnológicos que obrigam a uma constante evolução dos sistemas de informação, com vista a proteger e mitigar os perigos a que os utilizadores são sujeitos diariamente, o Portal da Queixa procura estar sempre em compliance com os mais altos padrões de conformidade e regulamentação, mesmo em processos complexos de adoção à realidade portuguesa, como este novo Regulamento dos Serviços Digitais que a ANACOM foi obrigada a transpor em tempo recorde e que certamente causará muitas dúvidas aos cidadãos, relativamente à sua aplicabilidade em território nacional".

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Ainda não existe modelo sancionatório, que faz parte da proposta que foi entregue ao Governo, mas Luis Correia diz que será semelhante a outros sectores, com sanções aplicadas face a incumprimento dos serviços intermédios, até porque já foram identificadas centenas de entidades com sede em Portugal, um número que poderá crescer.

O relatório foi entregue à tutela da área das infraestruturas, mas também da comunicação social, cultura e digitalização, e não há ainda data para que seja aprovado o modelo a implementar. Mas Portugal está já a correr contra o tempo nesta área, sendo que "é importante mostrar à Comissão Europeia o que estamos a fazer", explica Sandra Maximiano, até mesmo antes dessa aprovação, pelo que as iniciativas já estão a ser desenvolvidas e os processos investigados.

Das propostas fazem parte a disponibilização do público de formulários e ainda linhas de orientação para a apresentação de reclamações, candidaturas ao estatuto de sinalizador de confiança e a organismos de resolução extrajudicial de litígios. O grupo de trabalho propõe também a elaboração de um estudo para a identificação dos prestadores de serviços intermediários em Portugal, que deverão ser centenas, como antecipa Luis Correia, e a elaboração do caderno de encargos, em colaboração com outras autoridades relevantes, e lançamento de um processo de aquisição para a plataforma de suporte à execução do RSD.

Recursos necessários para um projeto de grande dimensão

Sandra Maximiano sublinhou aos jornalistas a complexidade da tarefa do coordenador do regulamento e a necessidade que a ANACOM teve de se preparar para este desafio. Para já apenas usando recursos internos, financeiros e de pessoas, com 4,5 FTEs (recursos alocados),  num trabalho que vai sendo gerido com o apoio de outras áreas, num grupo de trabalho de 8 pessoas.

Numa situação ideal, a ANACOM deveria ter "uma equipa de 15 a 20 pessoas exclusivamente afetas a este projeto", e Luis Correia admite que o número poderá aumentar em função das necessidades, lembrando que uma estimativa da Comissão Europeia aponta para "a possibilidade de cada autoridade nacional receber entre 10 a 100 mil queixas por ano". São perfis com grande complexidade técnica, e conhecimento do regulamento e de tecnologia de algoritmos e dados, que nem sempre são fáceis de encontrar no mercado.

"Estamos todos a aprender e a ver como será a evolução com uma perspetiva de crescimento gradual de recursos", afirma Sandra Maximiano.

Em resposta ao SAPO TEK, a presidente da ANACOM valoriza o trabalho que tem sido feito em Portugal para recuperar terreno nesta área e compara com outros países onde o cenário "é diverso". "Alguns países tiveram a designação e diploma de execução mais cedo, já começaram a trabalhar na estrutura interna mais cedo e têm mais avanço", admite. Ainda assim, Luis Correia garante que "não estamos distanciados e temos feito uma recuperação impressionante nos últimos três meses".

Nota da Redação: A notícia foi atualizada com mais informação, última atualização 26/6 às 7h34