Uma investigação conjunta do The Insider e do jornal alemão Der Spiegal revelou os contornos de uma operação alegadamente organizada por várias agências dos serviços secretos russos para desacreditar a Ucrânia e promover o medo dos efeitos da guerra entre os ocidentais.
Desde que a guerra começou têm sido várias as pistas de que a internet e a informação manipulada e disseminada online também são armas importantes. Os relatórios divulgados agora apontam alguns dados mais precisos relativos à mecânica de uma destas operações e até a alguns dos custos envolvidos. A operação foi batizada como Projeto Kylo e terá sido lançada em 2022.
A campanha orquestrada pelos serviços secretos russos, com destaque para o SVR que conduz operações internacionais, terá envolvido várias ações. Desde protestos falsos contra o Estado ucraniano, encenados por pessoas pagas para o efeito, que também gravaram e divulgaram online esses protestos, divulgação de notícias falsas e reforço da divulgação e destaque de conteúdos para minar a credibilidade da Ucrânia.
Uma das ações principais da campanha era a encenação de protestos e a sua posterior divulgação online que, segundo os documentos agora vistos, terá envolvido cerca de 100 pessoas. Cada uma terá recebido 100 euros pelo trabalho. A campanha integrava outras ações, como a criação de sites com notícias falsas para disseminar informações que mostrassem o impacto negativo da guerra para a economia dos países que apoiam a Ucrânia.
Outras investigações já tinham mostrado que a Alemanha tem sido um dos grandes alvos destas ações. Os serviços de inteligência do país têm aliás procurado identificar sites e notícias com este perfil e denunciado vários publicamente. Uma das notícias já divulgadas como exemplo de informação fabricada foi esta: "Como os ucranianos estão a roubar a prosperidade económica da Alemanha". Os relatórios confirmam que o assunto refugiados era um dos preferidos da campanha.
Em paralelo com estas ações concretas, havia uma estratégia de médio prazo para desacreditar a Ucrânia, através de ações online permanentes que ajudassem a focar a atenção dos utilizadores em conteúdos que exploravam a temática nazi e a sua alegada proximidade ao regime de Kiev, por exemplo. Os relatórios vistos pelos jornalistas que conduziram a investigação mostram que os espiões russos pagavam cerca de 3 euros por mês a quem assumisse estas tarefas de manipulação da informação.
Nos relatórios há ainda um balanço deste tipo de ações, sublinhando os bons resultados obtidos até à data e a previsão de que essa linha de ação continue a gerar os resultados desejados no futuro. "A guerra das redes no ciberespaço da UE, com base nas crescentes exigências dos migrantes ucranianos e nas novas vagas de descontentamento da população local provocadas por esta situação, terá, de acordo com estimativas preliminares, uma eficácia muito elevada, tanto agora como num futuro próximo", refere o documento traduzido pelas duas publicações.
O relatório refere explicitamente que a campanha tinha como objetivo cultivar o medo entre os ocidentais e explorar os receios à volta da incerteza perante o futuro, imposta pela guerra. O "mote da nossa campanha psicológica nos países [ocidentais] é incutir a emoção mais forte da psique humana - o medo", explicita o documento. "É precisamente o medo do futuro, a incerteza do amanhã, a incapacidade de fazer planos a longo prazo, o destino incerto das crianças e das gerações futuras. O cultivo destes estímulos inunda o subconsciente de um indivíduo com pânico e terror".
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