Ao longo dos próximos dois dias, a temática do regime de acesso aos metadados vai estar em discussão na Metadata Law Enforcement Conference, que reúne representantes de 31 órgãos de polícia criminal de 26 países.

Nas palavras de Luís Neves, diretor nacional da Polícia Judiciária, durante a sessão de abertura da conferência que o SAPO TEK esteve a acompanhar, os novos tempos da digitalização e globalização colocam os órgãos de polícia “perante um momento histórico”, que está em acelerada evolução, e marcado pela forma como as organizações criminosas se aproveitam desta realidade.

Por um lado, as organizações recorrem a uma variedade de táticas de difícil rastreio para levar a cabo as suas atividades criminosas, da utilização de meios encriptados à dark web. Por outro, os meios de obtenção de provas “mantêm-se imutáveis há décadas", dificultando a atuação dos órgãos de polícia.

Como realça Luís Neves este é um status quo, marcado por uma “luta profundamente injusta e desigual”, que precisa de ser mudado.

O diretor nacional da Polícia Judiciária salienta que o acesso à prova digital, e sobretudo aos metadados, não deve ser visto como uma forma de vigilância dos cidadãos, lembrando que este acesso só é possível em caso de suspeita ou ameaça ou no que toca à prática de crimes, e que o mesmo deve ser feito para investigar estas situações.

Luís Neves defende que é necessário que haja uma evolução legislativa que seja capaz de se adaptar às novas realidades, tanto da investigação criminal, como das tendências tecnológicas.

Metadata Law Enforcement Conference
Luís Neves, diretor nacional da Polícia Judiciária (à esquerda) e Catherine de Bolle, diretora executiva da Europol (à direita).

Jürgen Stock, secretário-geral da INTERPOL, afirma, numa mensagem de vídeo, que órgãos de polícia devem estar na “linha da frente” no que respeita às novas tecnologias, adaptando-se à evolução e percebendo de que forma é que podem tornar os processos de luta contra o crime mais eficazes. “Se não evoluirmos, não vamos conseguir avançar”, enfatiza.

A recolha e partilha de informação é a força vital das forças policiais. Dados de todos os tipos, incluindo tráfego e localização dos utilizadores, pode ser vital para uma investigação”, detalha o secretário-geral da INTERPOL, lembrando que, por vezes, pequenos pormenores fazem a diferença entre “levar um criminoso à justiça ou somar mais uma vítima à lista”.

“Claro que toda a recolha e retenção de dados deve respeitar os princípios-chave de uso responsável. Deve ser proporcional e necessária, relevante e guiada por um propósito”, defende Jürgen Stock.

“acesso, armazenamento e uso dos dados deve ser transparente e respeitar os direitos humanos fundamentais”, com medidas de segurança e responsabilidade para impedir abusos. Em linha com Luís Neves, Jürgen Stock afirma que tal não se trata de vigilância, nem de recolher dados para monitorizar os cidadãos de forma indiscriminada. “Há um equilíbrio que é preciso atingir para garantir a privacidade, liberdade, segurança e justiça”, defende.

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É certo que os legisladores vão continuar a fazer regras e os órgãos policiais a defender e aplicá-las, mas, como salienta Jürgen Stock, é necessária uma maior coordenação, com órgãos policiais a deixarem bem claras quais são as suas necessidades comuns. "“As regras devem ser claras, devem ser aplicadas, mas não podem fragmentar as operações policiais”. 

Catherine de Bolle, diretora executiva da Europol, realça que as organizações criminosas estão a aproveitar das dificuldades, incluindo legislativas, que existem para usar tecnologias, como encriptação, para fins maliciosos. 

“A falta de um regime unificado de retenção de dados por todos os Estados-membros da UE resultou numa ‘manta de retalhos’ de quadros legais para os órgãos policiais e procuradores obterem dados relevantes”, afirma Catherine de Bolle.

Além disso, “a retenção de dados está a ser regulada a nível europeu em partes separadas”, detalha a diretora executiva da Europol. “Inconsistência e fragmentação geram uma variedade de desafios e justificam o apelo a uma maior harmonização dos quadros legais”.

Citando dados de um estudo levado a cabo pela Europol, a responsável ressalta que a falta de um quadro regulatório para a retenção de dados a nível europeu para fins de investigação criminal continua a afirmar-se como um dos principais problemas para as autoridades judiciais quando necessitam de aceder a dados, sobretudo dados digitais, nos Estados-membros da UE.

A Europol e a comunidade de órgãos policiais defendem a criação de um regime de retenção de dados equilibrado e “à prova do futuro”, que “tenha em conta os avanços tecnológicos e o seu impacto na capacidades das autoridades de prevenir e combater o crime e assegurar a proteção dos direitos fundamentais”, afirma Catherine de Bolle.

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Numa mensagem de vídeo, Ylva Johansson, comissária da União Europeia para os Assuntos Internos, afirma que o “acesso aos dados é a chave para combater o crime”, no entanto, o “acesso aos dados está cada vez mais difícil”, não só devido às táticas utilizadas pelos criminosos, mas também devido aos critérios “rígidos” impostos pelo Tribunal Europeu de Justiça no que respeita à retenção de dados.

A propósito da temática que vai estar em debate ao longo da conferência, a comissária aponta para o impacto na proposta da Comissão Europeia que prevê que as empresas tecnológicas tomem mais medidas para combater o abuso sexual de crianças online na UE, a qual tem vindo a enfrentar oposição.

Ylva Johansson afirma que, caso a proposta seja rejeitada, as empresas com serviços online serão proibidas de detectarem conteúdos de abuso sexual de menores online em mensagens, “algo que têm feito por mais de 10 anos”, e que são pistas das quais os órgãos policiais dependem para salvar crianças e impedir casos de abuso e violência.

Nota de redação: A notícia foi atualizada com mais informação (Última atualização: 12h14)

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