Portugal poderia arrecadar 600 milhões de euros este ano se taxasse os lucros das multinacionais a 25%, enquanto a União Europeia (UE) receberia perto de 170 mil milhões de euros, revela um estudo do agora criado Observatório Fiscal.
“Há muitas receitas a serem geradas na Europa através da cobrança daquilo a que chamamos o défice fiscal das empresas multinacionais – isto é, a diferença entre o que uma empresa paga hoje em dia em impostos e o que teria de pagar se estivesse sujeita a um imposto mínimo em cada país em que opera – e, se este imposto mínimo fosse de 25%, calculamos que a União Europeia poderia receber 170 mil milhões de euros em receitas fiscais adicionais de impostos sobre as empresas por ano”, afirma à agência Lusa o diretor do novo Observatório Fiscal da UE, Gabriel Zucman.
Segundo o economista francês que vai liderar este observatório independente, “isto representaria um aumento de 50% face ao que [a UE] coleta atualmente com receitas do imposto sobre as sociedades”.
“Hoje em dia, as receitas do imposto sobre as sociedades na UE são de cerca de 340 mil milhões de euros e aumentariam para mais de 500 mil milhões de euros” por ano com uma taxação de 25% aos lucros das multinacionais, acrescentou.
Gabriel Zucman observa que este é “um aumento de cerca de 1,2% do PIB [produto interno bruto] na cobrança de impostos na UE”, destacando tratar-se de “muito dinheiro em receitas extra” que poderia ser usado “como contribuição” para fazer face à crise gerada pela pandemia de COVID-19.
No dia de lançamento do Observatório Fiscal da UE, a estrutura divulga este estudo sobre “A cobrança do défice fiscal das empresas multinacionais”, com simulações sobre futura cobrança sobre os lucros destas sociedades – como ‘gigantes’ tecnológicas –, que atualmente domiciliam as receitas onde lhes é mais favorável em termos fiscais.
O organismo precisa no relatório que uma taxa de 25% sobre os lucros das multinacionais iria equivaler a 167,8 mil milhões de euros em receitas fiscais, classificando este como um “instrumento poderoso e realista” para “gerar novas receitas de uma forma justa e sustentável”.
No documento, a que a Lusa teve acesso, é indicado que Portugal poderia arrecadar 600 milhões de euros este ano se aplicasse esta taxa de 25% sobre o lucro das multinacionais presentes no país, sendo que as maiores receitas fiscais seriam cobradas por países como Alemanha (29,1 mil milhões) e França (26,1 mil milhões).
Desde há vários anos que a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) discute uma proposta relativa a impostos adaptados a uma economia globalizada e digitalizada, visando então exigir impostos às multinacionais.
Muitos países têm vindo inclusive a defender um imposto mínimo global de 25% sobre as sociedades, mas no final de maio a administração norte-americana propôs uma taxa de pelo menos 15%, mostrando-se favorável a um acordo mundial.
Nestas declarações à Lusa, Gabriel Zucman classifica a taxa proposta pelos Estados Unidos como “muito baixa e sem justificação”, esperando consenso à volta dos 25% de taxação.
No relatório, o Observatório Fiscal da UE exemplifica que “empresas como a Shell, Iberdrola e Allianz [...] teriam também de pagar 35%-50% mais em impostos se estivessem sujeitas a um imposto mínimo de 25%”.
No estudo são também considerados outros cenários e, “com uma taxa mínima de 21%, a União Europeia cobraria cerca de 100 mil milhões de euros em 2021” às multinacionais, enquanto passando para “15% reduziria as receitas para metade desse valor”.
Isto equivale a 98 mil milhões de euros e a 48,3 mil milhões de euros em receitas fiscais para a UE, respetivamente, sendo que, com ambas as taxas (21% e 15%), Portugal arrecadaria perto de 100 milhões de euros.
Perante um “acordo internacional incompleto”, o observatório estima que cada país cobre às próprias multinacionais e “mais uma parte do défice fiscal das multinacionais incorporadas fora da União Europeia, com base no destino das vendas”.
O organismo faz ainda referência à possibilidade de um país avançar sozinho e antes dos outros nesta cobrança, referindo que, perante tal cenário, esse Estado-membro “encorajaria outros países” a fazê-lo.
Em meados de maio, em entrevista à Lusa em Bruxelas, o comissário europeu da Economia, Paolo Gentiloni, anunciou que o executivo comunitário vai apresentar a sua proposta de taxação da economia digital “no final de junho, início de julho”, sublinhando que a prioridade da União Europeia continua a ser “um acordo global” na OCDE.
A pedido do Parlamento Europeu, a Comissão Europeia abriu candidaturas para a criação deste Observatório Fiscal da UE, com um orçamento de 1,2 milhões de euros para o período 2020/2021, que foi ganho pela Escola de Economia de Paris, tendo Gabriel Zucman como responsável.
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