Para competir por recursos humanos escassos na área da tecnologia, há muito que vai além dos salários. Sobretudo nas empresas do sector, onde a esmagadora maioria dos colaboradores são perfis tecnológicos, é preciso mais para cativar e reter talento. Quando avaliam um empregador, diz Patrícia Horta, Section Manager da equipa de Technology da Hays Portugal, os aspectos que um candidato mais valoriza são a oferta salarial, o bom ambiente de trabalho, work-life balance, benefícios e solidez financeira. E entre os benefícios mais valorizados estão o teletrabalho, seguro de saúde, flexibilidade de horários, dias de férias extra e automóvel para uso pessoal, acrescenta.

Foi também isto que mostrou o resultado de um estudo realizado no ano passado pela plataforma portuguesa de reviews de profissionais de TI, a Teamlyzer. A liberdade para escolher o local de trabalho (remoto ou híbrido) e os horários foram os temas mais valorizados pelos quase 1.800 participantes, que responderam ao inquérito através do Reddit e do LinkedIN.

Tek Estudo Teamlyzer
créditos: Teamlyzer

“A entrada de multinacionais e de centros tecnológicos no nosso país, bem como o facto de várias empresas tecnológicas [estrangeiras] estarem a recrutar em Portugal, tem inflacionado, sem dúvida, salários e tornado o recrutamento muito competitivo no sector e tem levado as empresas a contrabalançar com políticas de retenção”, acrescenta Patrícia Horta.

Com as devidas exceções, as multinacionais parecem ter a lição melhor estudada que as empresas portuguesas nesta matéria. Pedro Moura, responsável de marketing da Landing.jobs, admite que um comentário frequente, por parte do talento, é que nas empresas internacionais (quer em casos de trabalho remoto para empresas fora do país, quer nos casos em que o empregador abriu um hub em Portugal), é mais fácil encontrar alguns destes atributos e vê-los cada vez mais valorizados. Melhor equilíbrio entre vida-trabalho, melhores processos de trabalho, de organização e de liderança e desafios técnicos mais interessantes são características mais atribuídas a projetos de empregadores estrangeiros do que a nacionais.

“No passado já houve muita discussão sobre a baixa qualidade de organização do trabalho e liderança em empresas nacionais, levando a problemas de equilíbrio pessoal e familiar, falta de produtividade e motivação”, lembra Pedro Moura. “Agora, com esta realidade efetivamente globalizada, temos a confirmação destas suspeitas”.

Para o responsável, o ónus de as empresas estrangeiras se encantarem com o talento nacional e de muitas empresas portuguesas não conseguirem extrair o mesmo “sumo” dessa mão-de-obra, não pode estar no talento. O problema estará nas empresas, que devem aproveitar este novo contexto de globalização do emprego para “aprender algo, evoluir na maneira como trabalham e tratam o talento, e como se posicionam no mercado global para serem mais competitivas”.

Quem está a contratar, para que áreas e o que oferece

Com a ajuda de duas plataformas - Landing.jobs e ITJobs - identificámos as empresas que mais ofertas de emprego têm publicado online desde o início do ano e falámos com algumas, para perceber em que posições mais estão a contratar, quantas contratações querem fazer este ano e que estratégias usam para cativar e reter talento.

A Volkswagen Digital Solutions é um dos muitos exemplos de centros internacionais de desenvolvimento com presença em Portugal, a trabalhar em coordenação com a unidade de Munique, da mesma divisão de inovação. Instalou-se em 2018 e até final do ano quer chegar aos 520 colaboradores, mais 70 que o previsto no plano de expansão inicial. Para já, tem 400, em três unidades.

SAP, Desenvolvimento de Software, Arquitetura de Redes, Project Management e Design de Produto são as áreas onde a Volkswagen Digital Solutions está a contratar em Portugal

A empresa divulga as posições em aberto, mas o responsável Rui Martins, faz questão de esclarecer que “não procura necessariamente um perfil em concreto ou limitado a competências”. Em vez disso, “procuramos pessoas que sejam tech savvy e que venham com uma imensa vontade de aprender, dinamismo, capacidade de comunicação, pensamento crítico, capacidade de resolução de problemas e gosto pelo trabalho em equipa”.

Para atrair talento, a VWDS aposta na flexibilidade, com um modelo híbrido de trabalho e a oferta de um valor suplementar, para que o colaborador possa equipar o seu home office e trabalhar em condições ideais. A proximidade não deixa de ser valorizada e por isso a empresa também fomenta a partilha e o networking nos escritórios, como forma de manter uma cultura forte.

O chamado salário emocional, complementar ao prémio financeiro, é aqui endereçado com tempo e detalhe. “Temos um conjunto de pessoas focadas em garantir que criamos as melhores condições de trabalho e que damos os melhores benefícios a todos”, garante Rui Martins.

“A componente salarial é muitas vezes comum ou idêntica entre as empresas tech, por isso, apostamos fortemente numa perspetiva cultural e de desenvolvimento pessoal e profissional dentro da empresa”. Isso abrange desde programas individuais de training, a iniciativas de promoção de wellbeing ou desporto, que vão sendo afinadas pelos Happiness Managers.

Hitachi Vantara quer reforçar equipa em, pelo menos, 60 colaboradores

A Hitachi Vantara anunciou em janeiro que vai trazer para Portugal um centro de serviços dedicado à monitorização de aplicações na cloud. Será o seu primeiro na Europa, mas o investimento em Portugal é mais antigo. Em 2018 foi reforçado com um centro de excelência na área da mobilidade e mesmo nessa altura a empresa já tinha no país quase 300 colaboradores, na maioria engenheiros.

Maria João Parreira, diretora de recursos humanos da operação local, revela que este ano a equipa em Portugal deve crescer, no mínimo, em 60 pessoas. Também aqui o modelo híbrido impera “porque reconhecemos que é a abordagem que, de momento, corresponde de maneira mais homogénea às expectativas dos nossos colaboradores, garantindo que as diferentes componentes do trabalho, infraestruturas, pessoas, necessidades e requisitos dos nossos clientes são devidamente considerados e assegurados”. Em alguns casos, a empresa também permite o full remote, para colaboradores que moram muito longe das localizações dos escritórios.

A Hitachi Vantara procura perfis nas áreas de Full Stack Developers, Software Engineers e Data Engineers.

A apoiar o modelo híbrido, a empresa japonesa tem também um subsídio para despesas domésticas associadas. Maria João Pereira explica ainda que a cultura da companhia pensa na integração do colaborador numa vertente humana, onde a saúde e segurança são considerados elementos essenciais. À disposição de quem trabalha na empresa há por isso “um ‘hub’ de serviços nas áreas da saúde física e mental, bem como ao nível do bem-estar financeiro ou na componente jurídica”. Está disponível acompanhamento psicológico, ou ao nível das finanças pessoais, descontos em serviços de parceiros, dias de folga extra férias, entre outros.

O upskill é igualmente uma preocupação, com a dinamização de palestras e webinars e há ainda espaço para a integração voluntária dos colaboradores em grupos de trabalho em áreas como a diversidade e inclusão, ou a sustentabilidade.

Claranet está a reforçar equipa com 100 colaboradores

A Claranet Portugal anunciou no final do ano passado a intenção de contratar 100 novos colaboradores e continua a executar o plano, que vai responder ao crescimento em número e complexidade dos contratos de serviços TI assegurados pela empresa. Catarina Graça, diretora de recursos humanos, explica que os valores promovidos pela empresa centram-se na abertura, diversidade, conhecimento e aprendizagem. A estratégia de recursos humanos da empresa assenta na preocupação de promover igualdade de oportunidades e não discriminação, numa cultura de trabalho “flexível e open-minded”.

A Claranet está neste momento a trazer para a operação em Portugal recursos com competências nas áreas de Cloud, Security, Applications, Data & AI e Operações.

Nos benefícios extra-salário, uma das grandes apostas vai para opções que ajudem a promover o equilíbrio entre vida profissional e pessoal. O regime híbrido (com apoio de material de escritório) encabeça a lista, onde também estão uma plataforma de benefícios flexíveis, oferta de dias de folga, cheque oferta quando o colaborador tem um filho, seguro de saúde, eventos de team building e iniciativas de responsabilidade social.

100 também é o número de reforços previsto na Noesis em 2023

A Noesis este ano pretende contratar 100 novos colaboradores e também já iniciou o processo de recrutamento, com várias ofertas publicadas nesta altura. “A captação de talentos é uma das nossas prioridades, e pilar central para o cumprimento do plano estratégico da Noesis para o triénio 2021-2023”, admite Teresa Lopes Gândara, Human Capital Senior Director.

A Noesis está à procura de novos colaboradores para as áreas de Infraestrutura, Cloud e Cibersegurança, Data Analytics, Inteligência Artificial, Automação, Desenvolvimento Aplicacional e de Software, Quality Assurance e Testes, desde recém-licenciados a Tech Leaders.

Com centros de competências em Lisboa e no Porto, Coimbra, Proença-a-Nova, Guarda e Covilhã, a empresa quer reforçar equipas em todos, com especial destaque para Lisboa, embora também sublinhe que acredita num modelo híbrido e de flexibilidade laboral. Refere, aliás, que está neste momento a testar um novo modelo híbrido, mais flexível.

Aqui os benefícios extra salário são definidos com a preocupação de ir ao encontro de diferentes necessidades e gostos - não são necessariamente iguais para todos os trabalhadores, ainda que todos tenham acesso a alguns, como os descontos em diferentes ofertas de parceiros, nas áreas habituais deste modelo de benefícios. Apoio médico, massagens, iniciativas de promoção do desporto, ou programas de formação e certificação também estão disponíveis. Neste domínio, além das Noesis Academy, em 2022, a empresa começou a dar acesso a conteúdos da plataforma Udemy.

150 novas vagas de emprego vão ser abertas pela Agap2IT nos próximos meses

Outra empresa com várias posições em aberto neste momento é a Agap2IT. Até final do ano, o plano é integrar 150 novos colaboradores, numa lógica de flexibilidade com as expectativas de quem entra na empresa, que passa por acolher tanto o modelo híbrido, como totalmente remoto. Sempre que possível, com flexibilidade de horário, como explica Gonçalo Roque, diretor executivo.

Além de procurar ir ao encontro das expectativas dos colaboradores no modelo de trabalho, a Agap2IT diz que aposta no estímulo à requalificação profissional, em benefícios flexíveis, apoio médico (medicina geral, psicologia ou nutrição), aulas de yoga, apoio jurídico (sobretudo para colaboradores estrangeiros), ou em iniciativas de responsabilidade social.

A Agap2IT está a reforçar equipas nas áreas de Big Data/Data Science, Cibersegurança, desenvolvimento soluções web (FE/BE), homologação de qualidade de software (QA) ou gestão de projetos, sem esquecer as áreas de IoT/Inteligência Artificial/blockchain.

Sem querer divulgar números de contratações previstas para este ano, por agora, a Capgemini é um dos prestadores de serviços da área da tecnologia que mais recruta em Portugal, mantendo vagas abertas em diferentes áreas.

Em setembro passado, quando completou a integração da Altran na Capgemini Engineering, a empresa anunciou planos para chegar aos 4.000 colaboradores até dezembro, mais 600 do que tinha à data do anúncio. A empresa diz que as políticas de captação e retenção de talento são fundamentais para manter a atratividade.

A “valorização e desenvolvimento profissional, bem como a flexibilidade na gestão da atividade são muito importantes”, admite Filipa Gamanho Esteves, CHRO da Capgemini Portugal. A empresa aposta também em diferentes iniciativas de apoio e promoção de bem-estar pessoal, mantém um investimento forte nas certificações e planos de mentoring e assegura que é feita uma análise e ajustamento constante ao plano de carreira dos seus profissionais, tendo em conta a evolução das tecnologias e as suas expectativas individuais.

A Capgemini está a reforçar a equipa com perfis em várias áreas, entre elas: JAVA, Cloud e Cibersegurança, Desenvolvimento e Engenharia de Software, ServiceNow, Gestão e Arquitetura de Dados, Automação de Processos e Sistemas, Gestão de Networks, Analistas Funcionais, Especialização em Outsystems, Salesforce, Microsoft Dynamics, Azure, AWS, Python e SQL.