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"Não se pode substituir humanos por tecnologia", defende o professor catedrático na Universidade de Cambridge e investigador no Alan Turing Institute, a propósito do livro que apresenta esta semana em Lisboa, 'Humano, demasiado Humano: O que nos torna únicos na era da Inteligência Artificial' (The Atomic Human, no original).
No livro, Neil Lawrence aborda conceitos como o da inteligência, o qual considera ser um termo "difícil de definir" tal como beleza ou obscenidade, mas todos querem "falar sobre inteligência artificial ou recriar a inteligência", diz.
"Acho que a simplicidade com que o termo é usado é muito prejudicial", admite.
Enquanto humanos "achamos que há uma série de coisas que nos tornam únicos, quer isso fosse no passado, não apenas pensar, mas também trabalhar, como construir coisas e trabalhar com ferramentas e, lentamente, o que temos visto é que conseguimos que máquinas façam algumas dessas coisas, então conseguimos construir máquinas a vapor. E então a noção é que isso é como cortar, retirar algo de nós", prossegue, explicando a inspiração do nome do livro no filósofo grego Demócrito.
"Agora temos máquinas que conseguem fazer trabalho manual. Agora temos máquinas que fazem trabalho mental. E, novamente, está a cortar em nós", acrescenta, aludindo à teoria do atomismo.
Por isso, a ideia do Atomic Human "é pensar sobre uma série de coisas que nos tornam únicos" como o sofrimento, o amor ou a empatia ou até mesmo a relação com Deus.
"Embora não seja pessoalmente religioso, até concordo em certo ponto com todas estas ideias, mas o livro tenta ir a um ponto mais fundamental do que isso", explica.
"A ideia no livro é que as coisas que nos tornam distintos não são as nossas capacidades, são as nossas vulnerabilidades e as nossas fraquezas e como as superamos através da nossa cultura que é o que nos torna humanos. E num sentido muito real, o computador não consegue ter isso porque não tem essas coisas", argumenta Neil Lawrence.
Depois, o facto de as máquinas comunicarem, dependendo de como se mede isso, entre 30 e 300 milhões de vezes mais rápido que os humanos é a diferença entre andar a pé e a velocidade da luz.
Compreendendo isso "começa-se a ver a idiotice de algumas coisas que pessoas muito inteligentes estão a dizer" como "a máquina é mais inteligente que nós", critica o especialista.
"Não se pode, não se consegue medir isso, não faz sentido, mas podemos medir as taxas de informação", acrescenta, apontando que, mesmo sem IA, a máquina é a diferença entre o passo de caminhada e a velocidade da luz mais rápida do que os humanos, o que é possível medir.
Para Neil Lawrence, é importante que as pessoas compreendam o básico para que possam tomar boas decisões e mudem a narrativa e coloquem o humano no centro das coisas, "em vez de algum ideal tecno-utópico de Silicon Valley".
No centro dos debates atuais sobre IA está "uma visão reducionista da inteligência", em vez da verdade, que, "na nossa inteligência, é contextual".
Comparando a inteligência a um veículo e questionando-se qual é o melhor, a resposta dependerá do contexto e isso é também verdade para a inteligência, explica, porque diferentes formas de inteligência manifestam-se de diferentes formas.
"Estamos a ouvir coisas ridículas a serem ditas por pessoas muito inteligentes, tal como aconteceu na era da eugenia, com o mesmo mal-entendido", o que tem consequências, adverte Lawrence, que prefere usar o termo inteligência automática do que inteligência artificial. Até porque "quando se vai num avião não dizemos que vamos num voo artificial", exemplifica.
"Não sei se é por causa do uso de inteligência artificial em ficção científica que desencadeia um conceito muito enganador de que criamos não só uma coisa que consegue comunicar consigo, mas que está sempre certa", refere, apontando que se se considera a máquina inteligente, então o mesmo serve para a ecologia.
"A máquina é tão diferente de nós como a ecologia. E o que é interessante nesta analogia é que quando vemos as formas como danificamos a nossa ecologia, então quando estamos a olhar para a poluição ou envenenamento do ambiente", que "têm efeitos a jusante durante décadas, centenas ou milhares de anos, como vemos com o clima, esse é o mesmo tipo de dano que a máquina nos está a fazer", refere.
Para o académico, é preciso garantir que as máquinas estão a fazer coisas que estão nos interesses humanos mais amplos.
Isto "em vez do que enfrentamos neste momento, onde as máquinas estão a fazer coisas que não estão no interesse da máquina, mas no interesse de alguém que nunca nos conheceu, nunca nos conhecerá e não entende as nossas vidas e, na verdade, nem sequer controla a própria máquina".
"Queremos um ecossistema onde os valores humanos possam evoluir com as circunstâncias", o que significa que "deveríamos estar a ver a máquina como uma ferramenta para os humanos" e não apenas para alguns. E este é o ponto de situação atual com o desenvolvimento da tecnologia "nas mãos de alguns", enfatiza.
Lawrence lamenta a falta de diversidade no debate sobre IA, nomeadamente mulheres, defendendo que é preciso "capitalizar ao ouvir um conjunto mais diversificado de vozes em termos da sua abordagem à tecnologia" e ter um ambiente mais colaborativo.
Sobre o que espera que os leitores aprendam com o livro, salienta que trata-se de "confiança, familiarização e construção daquilo que as pessoas chamam de 'affordance' [possibilidades/funcionalidades/capacidades]".
O lado "maravilhoso sobre esta tecnologia é que ela é toda sobre possibilidade, porque pela primeira vez temos uma tecnologia com a qual os humanos podem interagir diretamente e dizer à máquina o que gostariam de fazer", sublinha.
O propósito do livro "é encontrar um ponto de apoio para que todos se sintam confiantes sobre essa resposta e comecem a dizer: Não, eu faço parte disto", remata.
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