A propósito da sexta edição do RALI – Realidade Aumentada em Lisboa, com organização a cargo da ITPeople, um dos temas do evento centrou-se no impacto da realidade aumentada na cultura e no Homem e um dos convidados foi o Monsenhor Tomasz Trafny, líder do Departamento de Ciência e Fé do Vaticano. Servindo de conselheiro tecnológico ao Papa, lida com a cultura e análise de tecnologias ligadas à ciência natural. “Como conselheiro, trabalho com todas as expressões culturais que a Igreja considere importantes”, esclareceu a sua posição em entrevista ao SAPO TEK.
Perguntando como é que a Igreja lida com uma sociedade cada vez mais dependente de tecnologia, refere que se trata de um desafio, pois por um lado deve focar-se no desenvolvimento da sociedade em todas as dimensões, não podendo evitar as ciências e tecnologias. “É preciso tomar atenção e compreender, mas também envolver-nos, porque durante um longo período da História, a Igreja era conhecida por perseguir cientistas e pessoas inteligentes”, aludindo à inquisição .
Na visão do Monsenhor, as pessoas ainda olham para a Igreja como uma entidade que condena o seu trabalho e as suas descobertas, “mas não, a igreja esteve sempre muito envolvida com a ciência. As pessoas não se lembram, ou não querem lembrar, que muitas universidades foram construídas e são geridas pela Igreja, suportando novas ferramentas e atingindo novos conhecimentos.” Refere ainda que tem uma equipa de astrónomos treinada profissionalmente e são codetentores de um dos telescópios mais poderosos do Arizona, com pessoas a trabalhar precisamente para o Vaticano.
“Precisamos de compreender a realidade. Se acreditamos que o universo é a criação de Deus, precisamos de entender”, justifica o interesse do Vaticano na tecnologia, “as pessoas têm uma visão muito primitiva de Deus”, completa. O Monsenhor explica que muitas pessoas não conseguem entender as mensagens bíblicas contidas no “livro sagrado”, fruto de pobres catequeses e das poucas ligações entre a religião e ciências naturais. “Durante muito tempo, as pessoas separaram a razão e a crença. Há uma espécie de convicção e que acreditar é irracional e não é lógica. Mas é lógica. Por isso temos de investigar a realidade na Natureza, se realmente acreditamos que o ato de Criar é uma expressão de Deus”.
O responsável do Vaticano refere que Deus deu inteligência e cérebro às pessoas “e não foi como elemento de embelezamento ao corpo”, considerando que deve realmente ser utilizado com sensatez e responsabilidade. “Essa é a forma de manifestação como criaturas de Deus, de fazer algo bom, com benefícios para a humanidade”.
O uso da tecnologia na Igreja
Tocando no tema que o trouxe ao RALI, a utilização de realidade aumentada para ajudar a partilhar os ensinamentos da Igreja, refere que ainda estão muito atrás neste tipo de tecnologia e na sua implementação nas atividades pastorais, embora concorde na sua utilização em áreas como a catequese. Segundo explicou, a realidade aumentada e virtual poderia dar imagem aos ensinamentos bíblicos de uma forma distinta, mais envolvente e profunda, e sobretudo, com mais impacto. “Nos Estados Unidos já se começa a utilizar realidade virtual na Igreja, mas ainda não é significativo”, completa. Imagine aprender a história da Arca de Noé, totalmente imerso na famosa tempestade, por exemplo".
Tomasz Trafny explica que uma das principais barreiras ao progresso tecnológico da Igreja é a limitação digital dos sacerdotes e dos bispos, por não serem treinados com tecnologias. “Nos seminários não existem disciplinas ligadas às ciências naturais e tecnologia, e as pessoas hesitam em abraçar algo novo. E a realidade aumentada e virtual é algo novo”. Ainda assim defende, como conselheiro do Papa, que ao longo dos séculos, muitos dos líderes da Igreja mostraram-se a favor das descobertas tecnológicas e ferramentas. “Tudo aquilo que seja bom e espalhem o bem pelas pessoas, devemos adotar”, completou o raciocínio, prometendo, mas sem revelar, algumas surpresas para os próximos meses.
Durante a sua conferência, referiu-se aos Humanos 2.0, com alterações genéticas, próteses biónicas e outras mudanças físicas nas pessoas como resultado da tecnologia. Mas será que concorda com as transformações das pessoas? “Não concordo com as melhorias radicais do ser humano, mas precisamos entender um ponto crucial: os cristãos são uma minoria, tendo em conta a população mundial, e há culturas que não partilham as nossas preocupações morais e a nossa visão do ser humano e a sua dignidade”. O Monsenhor refere-se por exemplo, às alterações genéticas aos fetos das mulheres grávidas feitas por investigadores chineses, que levaram a preocupações éticas no ocidente. “As pessoas vão continuar a tentar puxar a sociedade nessa direção, mas a nossa posição, invés de condená-las, é envolver-nos e falar com elas, tentando explicar os possíveis cenários que podem ser danosos para o ser humano”.
Para referir problemas éticos antropomorfológicos associados, Tomasz Trafny dá o exemplo de pessoas “melhoradas” com próteses: “serão estes reconhecidos em nós, Homens comuns, ou serão tratados como um ser superior, super-humanos, porque foram modificados?” Exemplos disso são os atletas, que com próteses biónicas, são capazes de se distinguir superiormente no desporto. “Há limites, ou não existem barreiras na intervenção na nossa estrutura biológica?”, este é para si, o grande dilema antropomorfológico cultural que é necessário refletir.
Compreende, no entanto, que em situações específicas, como acidentes ou baixa de guerra, quando uma pessoa perde um braço ou perna, se faça a sua substituição. Ainda assim, é preciso alertar para as próteses de titânio, completamente sincronizadas com o sistema nervoso, que são sete e oito vezes mais resistentes que os membros humanos, e que pisam o tal risco mencionado anteriormente. “Há limites que necessitam ser registados, e quem diz tecnologia, o doping e as drogas são igualmente elementos de melhoramento que não devem existir”. Por outro lado, refere que utilizar equipamentos que ajudem as pessoas a puxar por si até aos seus limites é positivo e nesse caso, é o exemplo do uso de tecnologia pelo bem.
Sendo o conselheiro do Papa para área da tecnologia, não poderíamos acabar a entrevista sem perguntar se o Monsenhor é um “tech adopter”, para além do seu smartwatch que tinha no pulso, o smartphone e o portátil que são as suas ferramentas de trabalho. “Claro! Eu estudei eletrónica antes de me tornar padre, por isso não é novidade. Tento manter-me atualizado nos desenvolvimentos tecnológicos e tudo o que seja útil, e SE, SE, for acessível para mim, eu utilizo”. Com tantos encontros e responsabilidades e emails por ler, toda a tecnologia que o permite manter uma vida organizada é bem-vinda, refere Monsenhor, sobretudo para alguém bastante ativo nas redes sociais, tanto a nível profissional como pessoal, como é o seu caso.
E qual será o seu gadget favorito? “O meu gadget favorito, que não consigo utilizar todos os dias, mas que utilizo quando mergulho: uma máscara de dados, com um computador integrado que foi desenvolvido há muitos anos para propósitos militares dos Navy Seals, que fornece dados sobre a temperatura da água, a profundidade, a velocidade do mergulho, a compressão, além de mostrar a quantidade de ar disponível no tanque de oxigénio…
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