O projeto de regulamento apresentado pela Anacom para o leilão das frequências do 5G em Portugal está a levantar polémica. Depois de as três principais operadoras portuguesas se terem pronunciado contra as regras como são atualmente conhecidas, os presidentes da NOS e da Vodafone reiteraram a sua posição durante duas audiências da Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação.
Em questão sob a mesa de discussão volta a estar um dos principais pontos de discórdia: o facto de as regras do leilão preverem um desconto de 25% sobre o preço do espectro comprado por novas empresas nas faixas de 900 MHz e 1800 MHz e de não serem exigidas obrigações de cobertura e de desenvolvimento de rede como contrapartida.
Para Miguel Almeida, presidente da Comissão Executiva da NOS, é necessária uma “discussão séria” sobre o processo de atribuição das licenças para a quinta geração móvel. “O que está, neste momento, em cima da mesa é existir um debate no país e não serão mais três, quatro ou cinco semanas de atraso que serão fatais”.
O primeiro dos responsáveis a ser ouvido pelos deputados no dia 20 de outubro defendeu que “o que será fatal” é cumprir o regulamento como é conhecido até agora, indicando que o mesmo poderá “matar o 5G” em Portugal. Em linha com as suas declarações anteriores, Miguel Almeida afirmou que “impor a abertura das redes nacionais” a novos entrantes será “condenar o setor ao desinvestimento”.
“Ao reservar espectro [a Anacom] está a privar os atuais operadores de reforçar a capacidade das suas redes e, portanto, de melhorar a qualidade dos serviços prestados; ao não impor quaisquer obrigações de investimento, está a fazer com que os portugueses só tenham acesso às redes existentes e, portanto, não vão ter melhores serviços”, sublinhou
Citado pela Lusa, o presidente da NOS deu a conhecer que a Anacom trata os vários agentes no projeto de regulamento de “forma discriminatória” prevendo benefícios “ilegais” para novos players, como “auxílios de Estado ilegais na forma de 800 milhões de euros, que vão ser atribuídos a fundos de capitais predadores que, provavelmente, entrarão no mercado”.
“A narrativa adotada pela Anacom de falta de concorrência, investimento e competitividade no setor das comunicações em Portugal visa redesenhar a estrutura do mercado através da introdução de medidas de discriminação positiva nas regras do leilão de frequências de 5G”,
Referindo-se aos dados “enviesados” apresentados pelo presidente da Anacom, Miguel Almeida considerou tratar-se de um “comportamento inaceitável, que revela uma total falta de respeito pela democracia e reflete uma profunda incompetência”, e contrapôs estatísticas que demonstram que “a qualidade das redes em Portugal está muito acima da média europeia e os preços são bastante mais baixos que no resto da União Europeia”.
"Se a Anacom persistir numa avaliação parcial e enviesada do mercado e não alterar as regras propostas para o leilão, para além da ilegalidade que gerará, certamente, litigância, estará a condenar Portugal à irrelevância na futura economia digital, prejudicando de forma irreversível a competitividade das empresas e a evolução do nível de vida dos portugueses”, defendeu o presidente da NOS.
Vodafone: As atuais regras do leilão põem em causa o futuro do país
Já durante a sua audição na Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação Mário Vaz, presidente executivo da Vodafone Portugal, alertou para a possibilidade do “aumento de litigância” devido às regras do leilão de frequências para o 5G, sublinhando que “hipotecam o futuro do país”.
O responsável afirmou também que imprevisibilidade regulatória compromete o investimento da operadora no país e que “poderá criar “400 empregos qualificados”. Recorde-se que Serpil Timuray, CEO da Vodafone Europa, já tinha dado a conhecer que, caso a entidade reguladora avance com as atuais regras do leilão, a criação de um centro pan-europeu de pesquisa e investigação em Portugal estaria comprometida.
Mário Vaz garantiu que a operadora não tem “nada contra novos entrantes”, mas que é “contra tapetes vermelhos” para os mesmos “sem qualquer contrapartida”. O responsável acusa ainda a entidade presidida por João Cadete de Matos de criar um projeto de regulamentação que assenta numa “leitura distorcida e ficcionada da realidade”.
O presidente da operadora apelou a que “haja compromisso de quem vem fazer investimento equivalente aos que cá estão”, alertando para as possíveis consequências de manter as regras como estão.
Citando um estudo da consultora Roland Berger, Mário Vaz indicou que a entrada de novos players que não estejam sujeitos a obrigações poderá causar uma perda de 2.000 empregos. O responsável deu também o exemplo de Espanha, onde se reduziram “10 mil trabalhadores para reformular o modelo de negócios” devido às descidas de preços impostas por novos entrantes.
Anacom defende que "atua no estrito cumprimento da lei"
Ainda antes das audiências aos presidentes da NOS e Vodafone, João Cadete de Matos, presidente do Conselho de Administração da Anacom, tinha afirmado no início da semana, na apresentação da nova ferramenta tem.Rede?, que a entidade "atua no estrito cumprimento da lei", atendendo "aos interesses de todos os participantes no mercado, dos utilizadores, das autarquias e das metas estratégicas definidas pelo Governo".
Em declarações à Lusa, o presidente indicou que estava convicto de que "na apresentação do regulamento serão esclarecidas todas as dúvidas que têm sido suscitadas e completamente clarificadas as questões relativamente ao total suporte legal daquilo que a Anacom decidirá nesta matéria".
No que toca à discriminação entre operadores mencionada tanto pela Altice, como a NOS e a Vodafone, o responsável assegurou que a Anacom "pondera sempre todos os operadores, quer os que estão no mercado, quer os que queiram estar no mercado".
"Um leilão é precisamente isso, é a procura de cumprir os objetivos do interesse público, da promoção da concorrência, da defesa quer dos operadores que estão no mercado, quer dos operadores que querem entrar no mercado, para que o bem comum seja o resultado final", defendeu João Cadete de Matos.
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