A discussão sobre os efeitos nocivos da tecnologia no desenvolvimento das crianças e jovens tem crescido globalmente. A Austrália avançou com uma medida histórica, proibindo o acesso a redes sociais para menores de 16 anos, enquanto Portugal está a preparar alterações nas escolas para limitar o uso de telemóveis. Aqui ao lado, em Espanha, pondera-se regulamentação bastante restritiva, com propostas que prometem redefinir o acesso das crianças à tecnologia por idades.

Um comité de 50 especialistas, formado pelo governo espanhol, apresentou um relatório de 250 páginas que norteia um novo plano para proteger os menores dos riscos associados à tecnologia.

Perante os resultados, os peritos propõem que a exposição a dispositivos digitais seja completamente proibida para crianças com menos de três anos, sendo fortemente desaconselhada até aos seis.

Banir ou não os telemóveis das escolas, eis a questão. A resposta está no meio
Banir ou não os telemóveis das escolas, eis a questão. A resposta está no meio
Ver artigo

Entre os 12 e os 16 anos, será incentivada a utilização de telefones analógicos, restringindo o acesso à internet e às redes sociais. Além disso, todos os dispositivos comercializados em Espanha deverão incluir rótulos informativos sobre os potenciais riscos para a saúde mental e o desenvolvimento infantil.

As escolas terão um papel fundamental na implementação destas medidas. A prioridade será dada a métodos de ensino analógicos, especialmente na educação infantil e primária, eliminando jogos com sistemas de gratificação imediata nas aplicações educativas. Para os menores de seis anos, será permitido apenas o uso coletivo de ferramentas digitais em contextos didáticos supervisionados.

Em alinhamento com as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), os especialistas sugerem “zero horas de exposição a ecrãs” para crianças com menos de um ano e um máximo de uma hora por dia até aos cinco anos.

Entre as ações preventivas no âmbito da saúde, destaca-se a proposta de incluir nos check-ups pediátricos uma avaliação sobre os hábitos tecnológicos, assim como rastreios para ansiedade, depressão e outros problemas associados.

"Mãe, posso usar o teu telemóvel?" 10 conselhos de parentalidade positiva
"Mãe, posso usar o teu telemóvel?" 10 conselhos de parentalidade positiva
Ver artigo

Para as famílias, propõem-se campanhas de sensibilização e formação sobre limites de tempo de exposição e supervisão adequada, além de subsídios para programas educativos desenvolvidos por associações de pais e outras organizações.

O documento é fundamentado em estudos neurocientíficos e sociológicos que apontam o impacto da exposição precoce à tecnologia, incluindo prejuízos à saúde mental, como aumento da ansiedade, distúrbios do sono e dificuldade de concentração.

Do outro lado do globo, a Austrália aprovou uma lei inédita que proíbe o uso de redes sociais para menores de 16 anos. Plataformas como TikTok, Instagram e Facebook terão um ano para implementar sistemas que impeçam o registo de menores de idade. Caso não cumpram, poderão enfrentar multas de até 50 milhões de dólares australianos.

A legislação australiana não foi aprovada sem gerar críticas. Alguns especialistas alertam para riscos de privacidade, perda de autonomia parental e potencial isolamento social das crianças. Outros temem que a medida incentive o uso de plataformas ilegais ou a navegação na dark web.

Em Portugal, o Governo prepara-se para dar passos mais concretos na regulação do uso de dispositivos digitais por crianças. A recomendação de proibição de telemóveis nos 1.º e 2.º ciclos, implementada como medida experimental neste ano letivo, poderá tornar-se obrigatória no próximo.

Mais de metade das crianças em Portugal usam tecnologias quando brincam, aponta estudo
Mais de metade das crianças em Portugal usam tecnologias quando brincam, aponta estudo
Ver artigo

Fernando Alexandre, ministro da Educação, reforçou a necessidade de basear as políticas em evidências científicas e aprender com as experiências de outros países.

O estudo do Observatório da Saúde Psicológica e do Bem-Estar (OSPBE) revela que mais de metade dos alunos portugueses do 2.º ciclo ao ensino secundário passam pelo menos quatro horas diárias em frente a ecrãs, com impactos preocupantes na saúde e bem-estar.

Apesar de contextos diferentes, as iniciativas de Espanha, Austrália e Portugal apontam para uma tendência global: limitar a exposição precoce de crianças e jovens à tecnologia. A Austrália foi mais longe no que diz respeito às redes sociais, enquanto Espanha aposta numa abordagem mais ampla e integrada, que envolve não só os dispositivos, mas também práticas educacionais e a saúde pública. À medida que mais países adotam medidas semelhantes, é possível que um consenso internacional surja sobre o uso responsável da tecnologia por crianças.