Tal como em outras áreas da tecnologia, a explosão da inteligência artificial que aconteceu durante 2023 teve impacto nos produtos de consumo. A necessidade de ter IA em tudo o que é equipamento acessível a todos marcou uma tendência recorrente durante todo o ano, enquanto a OpenAI, Microsoft, Meta e Google corriam para desenvolver os principais modelos de IA generativa.
Mas a pensar na integração desta tecnologia nos equipamentos nas casas dos consumidores, uma das tendências do ano foi a introdução em computadores portáteis, smartphones e outros equipamentos inteligentes aquilo que ficou conhecido como NPU (Neural Processing Units).
Computadores ganham chips dedicados a IA
Estes chips de IA começaram a ser adotados pelas fabricantes de computadores portáteis e os primeiros modelos já foram apresentados neste final de ano, baseados no processador Intel Core Ultra, conhecido anteriormente com o nome de código “Meteor Lake”. Este novo processador passa a substituir os modelos Core “i”, prometendo aceleração de IA através da unidade de processamento (CPU), processamento gráfico (GPU) e agora processamento neural (NPU).
A Acer já anunciou os modelos Predator Triton e Swift Go 14 equipados com o Core Ultra, assim como a Asus para o seu ZenBook 14 OLED. A Dell, Dynabook, Gigabyte, HP, Lenovo, LG, Samsung, MSI e Microsoft vão adotar o processador em breve, somando mais de 200 computadores portáteis desta primeira geração de processadores de IA dedicados.
Mas a Intel não está sozinha nesta corrida para desenhar chips de IA. A Meta de Marck Zuckerberg também está a desenvolver um processador no contexto do programa de acelerador de modelos de IA. Este é um plano para um supercomputador que está a criar apenas dedicado a pesquisas de inteligência artificial, ainda que na altura fosse apontado como reforço do metaverso. Também a OpenAI, embora ainda não tenha tomado uma decisão final, pondera criar chips de IA para ajudar nos seus projetos. Provavelmente deverá usufruir do hardware da Microsoft, uma vez que recentemente revelou a criação de dois chips dedicados a IA.
Supercomputadores para acelerar a criação de modelos de IA
O tema dos supercomputadores está obviamente associado à inteligência artificial, porque são através destes que se obtêm a rapidez necessária para desenvolver os cálculos dos modelos. A Microsoft explicou como desenvolveu o supercomputador que ajudou a criar o ChatGPT da OpenAI, empresa em que investiu muitos milhões de dólares. Trata-se da mesma infraestrutura usada para treinar o modelo de IA do Bing, composta por milhares de GPUs da Nvidia, otimizados para o desenvolvimento de soluções de IA.
A NVidia tem sido também uma das grandes protagonistas da explosão da inteligência artificial, sendo uma das candidatas a figurar no “trillion dolar club” graças à procura avassaladora de tecnologia que permita colocar os datacenters a “falarem a mesma língua” que as aplicações de inteligência artificial. E pretende trabalhar em conjunto com a Foxconn para criar fábricas de inteligência artificial para automóveis autónomos.
No mundo dos computadores, a Arm Holdings continua a ser o holy grail da indústria e todos querem garantir a sua tecnologia nas suas soluções. A Nvidia tentou adquirir a empresa por 40 mil milhões de dólares, mas o negócio chumbou nos reguladores. A Intel quis blindar o seu negócio de processadores e assumiu interesse em participar num consórcio para aquisição da Arm, logo após a Nvidia ter falhado compra. A Apple levou um empurrão quando decidiu abandonar a Intel para criar os seus próprios chips baseados em Arm. E a AMD e a Qualcomm também não abdicam de criar chips baseados em tecnologia da Arm.
O plano da rivalidade da Nvidia e AMD passaram das placas gráficas para computadores domésticos para os chips de GPU que alimentam os supercomputadores. No caso da Nvidia, foi apresentado o GPU HGX H200 baseado na arquitetura Hopper, para acelerar a computação de IA generativa em supercomputadores e modelos de linguagem de alta capacidade. Mais recentemente a AMD anunciou a nova arquitetura de chips de IA Instinct MI300.
A fabricante pretende unir o seu hardware, software e ecossistema aberto, fornecedores de cloud e fabricantes para o desenvolvimento e adoção de soluções de IA. Estreia-se assim no negócio de processadores e aceleradores de IA dedicados.
Ainda no que diz respeito a supercomputadores, o Reino Unido investiu 273 milhões de dólares para ter uma das máquinas de IA mais potentes do mundo e vai estar à disposição da ciência. O Isambard-AI deverá estar operacional no verão do próximo ano, tendo a capacidade de realizar mais de 200 triliões de cálculos por segundo.
Portugal reforça capacidade com novos supercomputadores
Em Portugal, o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) anunciou o aumento da capacidade de investigação das condições meteorológicas, geofísicas e marinhas no país através de um novo contrato com a Atos para uma solução HPC. Este tem uma capacidade de processamento superior a 249 petaflops e baseia-se numa arquitetura BullSequana XH2000. No total tem 3.500 processadores Intel Xeon e de 14.000 GPUs Nvidia A100. No futuro, o supercomputador contará também com processadores quânticos.
Em setembro foi inaugurado o Deucalion, na Universidade do Minho, um supercomputador disponível à comunidade académica, empresas e administração que teve um investimento de 20 milhões de euros. Este modelo petascale é capaz de executar um desempenho máximo de 10 Petaflops, ou seja, 10 milhões de biliões de cálculos por segundo.
Antes do Governo ter cessado funções, foi dada a autorização para a despesa na aquisição, instalação e operação do supercomputador MareNostrum 5. O objetivo é acelerar o processo de transformação digital e digitalização da ciência e dos serviços de apoio ao sistema nacional de ciência e tecnologia. Em novembro, este entrou para o Top 10 dos supercomputadores mais poderosos do mundo, estreando-se no oitavo lugar. E o supercomputador foi inaugurado há dias, neste final do ano.
Também a FCT está à procura das melhores ideias para reaproveitar o equipamento do supercomputador Bob. Este foi inaugurado em 2019 e instalado no datacenter da REN em Riba d’Ave no Minho, é gerido em parceria pela FCT e pela Universidade do Minho.
Uma das notícias mais impactantes do ano foi a queda do Governo de António Costa, depois do primeiro-ministro ter renunciado o cargo por ter sido mencionado pelo Ministério Público no caso de corrupção relacionado com o projeto de construção do centro de dados SINES 4.0. A empresa responsável, a Start Campus, foi alvo de buscas e houve detenção de dois administradores. Em setembro, havia sido anunciado que os primeiros clientes do SINES 4.0 iriam iniciar a fase de configuração do primeiro edifício, o NEST, que deverá estar totalmente operacional até março de 2024.
Google, Microsoft e IBM continuam jornada pela “supremacia quântica”
Se os supercomputadores continuam a ser a base para os poderosos cálculos de algoritmos da IA, a jornada para a chamada “supremacia quântica” ainda está longe de chegar ao fim. E esta é uma disputa feita sobretudo a três braços: Google, Microsoft e IBM.
Estima-se que num prazo de dois a três anos as empresas comecem a obter os benefícios comerciais dos investimentos na área. As receitas e poupanças com computação quântica podem atingir até 850 mil milhões de dólares em 2035, ano previsto para a sua maturidade. Uma equipa de cientistas portugueses e italianos desenvolveu uma nova técnica para certificar propriedades quânticas em computadores fotónicos. À medida que a complexidade de dimensão dos dispositivos cresce, aumenta a necessidade de certificar os recursos quânticos que fornecem e mapear a sua utilização.
Em junho a Microsoft anunciou que completou a primeira etapa na construção do seu supercomputador quântico. Mas no seu roadmap, apenas espera alcançar a computação quântica em 10 anos, listando os objetivos propostos da missão científica para resolver os problemas mais complexos que a humanidade enfrenta.
A Google atualizou em julho o seu computador quântico e afirma que realiza cálculos 47 anos mais rápidos que um supercomputador. Esta nova geração é composta por 70 qubits, traduzindo-se numa capacidade de computação referida como 241 milhões de vezes mais poderosa que o modelo anterior que tinha 52 qubits.
Sempre pronta a refutar os resultados científicos da Google, a IBM mostrou no início de dezembro o seu novo computador quântico. O IBM Quantum System Two está localizado em Nova Iorque e já começou a operar. Os avanços realizados pela fabricante incentivaram a mudanças no roadmap, planeando os próximos 10 anos. O seu coração é o novo processador Heron, uma arquitetura desenvolvida nos últimos quatro anos. Este chip promete métricas de desempenho mais elevadas e uma menor taxa de erro.
Em Portugal, prepara-se os primeiros passos para a criação da rede nacional quântica, que garantirá a segurança das comunicações no espaço nacional. Prevê-se a instalação de quatro “nós” em Lisboa num conjunto de organismos governamentais. O projeto tem um orçamento de 6,8 milhões de euros e os sistemas de comunicações baseados na física quântica garantem a transmissão de dados encriptados sem possibilidade de interceção.
Estes foram os principais destaques do tema, mas certamente que se vão prolongar durante 2024, sobretudo quando o assunto é sobre a inteligência artificial, cada vez mais presente no nosso dia-a-dia.
Este artigo faz parte do Especial de análise das notícias e tendências de 2023 no mundo da tecnologia. Acompanhe ao longo da semana os artigos publicados pela equipa do SAPO TEK e a opinião exclusiva de especialistas do sector.
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