Na vertente da exploração comercial ou na vertente da investigação científica, não faltaram notícias sobre o Espaço ao longo de 2023, entre a chegada de novos protagonistas, o desvendar de mais mistérios por atores com experiência comprovada, o ultrapassar de novos recordes, a comemoração de aniversários ou o adeus de quem cumpriu a missão.
No campo dos recordes, o da permanência no espaço para um norte-americano pertence agora ao astronauta da NASA Frank Rubio, que passou 371 dias a bordo da Estação Espacial Internacional, fazendo mais de 252 milhões de quilómetros, aproximadamente o equivalente a 328 viagens de ida e volta à Lua. Com a estadia vai ajudar a perceber como o corpo humano reage à microgravidade por longos períodos.
Entre os aniversários redondos a destacar, estiveram os 65 anos da National Aeronautics and Space Administration, ou NASA, quase de certeza a agência espacial mais popular do planeta, e em grande parte responsável por garantir o encanto e envolvimento com os temas do espaço pelos fãs de astronomia. Na semana em que assinalou os 65 anos de vida lançou um site que recorda a história da agência, desde que foi criada em 1958.
Este ano também se comemoraram os 25 anos de operações da Estação Espacial Internacional. No dia 20 de novembro de 1998 era lançado o primeiro módulo e começava a ser construído, a mais de 400 quilómetros de altitude, o projeto de cooperação internacional de grande ambição que juntou a NASA, a ESA, a Roscosmos, a CSA e a JAXA com o objetivo comum de criar um local de testes e experiências científicas e tecnológicas em órbita, num ambiente de microgravidade, ou seja, diferente do obtido na Terra.
Em 25 anos, a ISS foi a morada de mais de 270 astronautas, um sem número de experiências e ainda mais fotos “orbitais” tiradas com vista privilegiada. E assim vai continuar, pelo menos até 2030.
As “justificações” e elogios àquela que vai continuar a ser a “casa” de astronautas de várias nacionalidades foram resumidos pela NASA num vídeo com cerca de dois minutos.
Veja o vídeo
Já por terras lusas, comemoraram-se os 30 anos do lançamento do PoSAT-1, o satélite que colocou Portugal no espaço. Usado para telecomunicações em vários países, nomeadamente pelo exército português, o primeiro satélite português era uma caixa de alumínio com 35 centímetros de lado e de profundidade, por 58 centímetros de comprimento e tinha cerca de 50 kg.
Do ponto de vista científico, estava equipado para recolher informação que permitisse fazer a caracterização das cinturas de radiação da Terra, o reconhecimento da distribuição dos níveis de radiação cósmica sobre a superfície terrestre e o estudo dos ventos solares.
Integrava 10 gavetas com placas eletrónicas, baterias e um módulo de deteção remota, além de sensores de altitude e estabilização. Os diversos sistemas a bordo eram alimentados com energia solar, graças à energia recolhida através dos painéis solares instalados no equipamento. Movia-se a uma velocidade média de 7,3 km por segundo e as comunicações com o nosso planeta tinham normalmente uma duração de 12 minutos.
Clique nas imagens para mais detalhe sobre o PoSAT-1
O PoSAT-1 deixou de emitir sinal em 2006, depois de um período de 13 anos operacional, cerca do dobro do tempo de vida inicialmente estimado, que era de cinco a oito anos. O “corpo celeste” metálico, com cerca de 50 quilos e meio metro de altura está atualmente, numa viagem silenciosa em órbita da Terra, prevendo-se que a sua morte física aconteça em 2043.
O PoSAT-1 permanece, até hoje, depois de 30 anos, como o único satélite lançado por Portugal, mas este cenário deverá mudar em breve, havendo vários projetos em desenvolvimento.
E para encerrar a ronda dos aniversários, nada melhor do que falar do maior e mais poderoso telescópio que a humanidade já colocou no espaço, de seu nome James Webb, que comemorou um ano de atividade pleno de descobertas e registos fotográficos.
Pode clicar na galeria que lhe é dedicada para ver alguns dos muitos exemplos.
Entre os muitos contributos que o telescópio espacial já deu à astronomia está a descoberta de uma nova anã castanha recordista como a estrela mais pequena do universo, sugerir que a formação de exoplanetas também acontece em ambientes hostis, mostrar o brilho do choque devastador entre dois planetas gigantes pela primeira vez ou ajudar a perceber os segredos da criação de elementos químicos essenciais à vida.
A chegada de novos atores e missão cumprida para outros
A par de protagonistas como o “velhinho” Hubble que ainda consegue entregar imagens deslumbrantes, do Perseverance que continua a “desbravar” Marte com o helicóptero Ingenuity por companhia a somar voos que já deviam ter terminado, da Parker Solar Probe a “queimar” perto do Sol ou das “cotas” sondas Voyager 1 e Voyager 2, o espaço acolheu novos atores.
Entre as novidades está o lançamento da Juice - Jupiter Icy Moons Explorer, em abril, no penúltimo veículo de lançamento Ariane 5. Depois de uma viagem de oito anos, a sonda vai começar a observar Júpiter com a intenção de recolher o máximo de informação possível acerca do sistema do gigante gasoso, como um todo, e o estudo pormenorizado de três das suas maiores luas: Europa, Ganimedes e Calisto.
O grande objetivo da missão da ESA que conta com know how português é perceber se estes corpos celestes reúnem condições para suportar vida. Há fortes indícios de que Europa e Ganimedes - e possivelmente também Calisto - tenham oceanos de água salgada debaixo das suas crostas geladas.
O Euclid também é um dos “atores espaciais” mais recentes. Lançado em julho com o objetivo de desvendar os enigmas da matéria escura e da energia escura, as primeiras imagens do telescópio foram divulgadas em novembro, revelando registos astronómicos nítidos com detalhes nunca antes vistos por um instrumento do género numa área tão grande do céu.
Já por parte da NASA foi lançada a Psyche, uma missão que vai explorar o enigmático asteroide metálico com o mesmo nome, depois de uma viagem pelo espaço de seis anos.
Com 226 quilómetros de diâmetro, Psyche fica situado no cinturão principal entre Marte e Júpiter e foi selecionado como objeto de estudo em 2017, como parte do programa Discovery da NASA. O asteroide tem vindo a intrigar os investigadores e acredita-se que o seu estudo poderá trazer novas respostas sobre o início do Sistema Solar.
A par dos que começaram de fresco, houve quem chegasse ao fim do seu propósito. Foi o caso da Aeolus, da ESA. Depois de quase cinco anos no espaço, a missão da ESA encarregada de observar padrões de vento a partir do espaço, melhorando assim as previsões meteorológicas e os modelos climáticos, foi descontinuada.
Os dados e a tecnologia da Aeolus terão um papel importante a desempenhar na precisão das previsões meteorológicas futuras. Em 28 de Julho, queimou numa reentrada assistida - a primeira reentrada assistida por uma missão que não foi concebida para tal.
Quem também chegou ao fim da sua jornada (ou pelo menos de uma primeira jornada) foi a OSIRIS-Rex, com o regresso bem-sucedido à Terra, acompanhada das amostras do asteroide ancestral Bennu, para análise.
Os primeiros resultados, revelados numa transmissão em direto, indicaram que as amostras contêm "água abundante" na forma de minerais argilosos hidratados. As moléculas de carbono e água são exatamente o tipo de material que se esperava encontrar, como elementos essenciais para a formação do nosso próprio planeta e para ajudar a determinar o que pode ter dado origem à vida.
Embora seja necessário mais trabalho para compreender a natureza dos compostos de carbono encontrados, as descobertas iniciais são um bom sinal para análises futuras da amostra do asteroide.
Clique para ver algumas das imagens das amostras em laboratório
Os segredos guardados nas rochas e poeira de Bennu vão ser estudados durante as próximas décadas, em laboratórios de vários países, num esforço conjunto para obter insights sobre como o nosso sistema solar foi formado e como os materiais precursores da vida chegaram à Terra.
No final de uma longa viagem, o melhor seria aproveitar para descansar um pouco, especialmente se tiver sido uma jornada de sete anos e 6,4 mil milhões de quilómetros para trazer amostras do asteroide Bennu. Mas a OSIRIS-REx pôs-se logo a caminho para explorar um novo destino.
Com um novo nome, a agora OSIRIS-APEX desta vez partiu para estudar o asteroide Apophis, ou “Deus do Caos”, que vai fazer um voo próximo à Terra em 2029, algo que não acontece desde o início da história registada.
Mais uma viagem, mais uma moeda com a Lua (um pouco) mais perto
O há muito anunciado turismo espacial parece ter arrancado oficialmente em 2023 depois de algumas “viagens grátis”. Aquele que foi o segundo voo comercial da Virgin Galactic mas o primeiro realmente “de passeio” aconteceu em agosto e teve direito a uma transmissão em direto de cerca de 50 minutos, que abrangeu o ganho de altitude até à separação da nave VSS Unity do avião VMS, o momento de gravidade zero proporcionado aos turistas e o regresso e aterragem.
A bordo da nave VSS Unity seguiu um trio de turistas: Keisha Schahaff e Anastatia Mayers, mãe e filha que ganharam os “bilhetes” num sorteio promovido pela empresa de Richard Branson em 2021, e Jon Goodwin, um ex-atleta olímpico que tinha comprado a sua passagem há 18 anos pelo valor de 250 mil dólares. Os três passageiros foram acompanhados por Beth Moses, instrutora-chefe de astronautas da Virgin Galactic.
Clique nas imagens para mais detalhe
A viagem no seu total terá durado cerca de 90 minutos, em que, durante aproximadamente 10 minutos, os turistas espaciais poderam flutuar em gravidade zero.
Este foi o segundo voo comercial da Virgin Galactic, mas o primeiro com turistas realmente pagantes. O Galactic 01 descolou a 29 de junho com três oficiais da Força Aérea italiana e um investigador, com o objetivo de realizar uma experiência científica de microgravidade a bordo.
De acordo com o avançado pela empresa de Richard Branson anteriormente, a intenção é realizar viagens com turistas espaciais mensalmente, embora até ao momento não tenham sido anunciadas futuras missões.
Ainda sem vertente turística, a Lua é de momento o destino mais cobiçado da exploração comercial do Espaço e a Índia juntou-se este ano à pequena lista de países que conseguiram “tocar” a superfície do satélite natural, com a missão Chandrayaan-3.
A missão fez da Índia o primeiro país a alunar na região do polo sul, que terá grandes quantidades de água gelada. Estava previsto que a missão indiana na superfície da Lua durasse à volta de 14 dias, período de carga útil das baterias da sonda e do robot com energia solar.
Até agora só os Estados Unidos, a antiga União Soviética e a China tinham tido sucesso na empreitada, mas o grupo pode vir a crescer em breve. A Agência Japonesa de Exploração Aeroespacial (JAXA) anunciou muito recentemente que o módulo SLIM entrou com sucesso na órbita lunar.
Lançado a 07 de setembro, juntamente com o satélite de investigação galáctica XRISM que faz parte de uma missão separada coordenada entre JAXA, NASA e ESA, o SLIM é mais uma tentativa do Japão para fazer a primeira alunagem bem sucedida, depois de vários fracassos. Se for bem-sucedido, o país será assim o quinto a “aterrar” na Lua.
E enquanto uns se estreiam, outros tentam o regresso. Foi o caso da Rússia com a missão Luna 25, que partiu em agosto à procura de vestígios de água gelada no satélite natural da Terra, e que antes chegou a mostrar as “vistas” da órbita lunar.
Entretanto algo correu mal e a sonda espacial russa, com destino ao polo sul da Lua, não chegou a cumprir o seu propósito.
Os preparativos de regresso à Lua continuam também por parte dos Estados Unidos que seguem com os seus planos das diferentes fases da missão Artemis. Neste momento já são conhecidos os quatro astronautas que vão voar na Artemis II, que já começaram os treinos, assim como os fatos feitos em colaboração com a Prada que os astronautas da Artemis III vão usar para “pisar” a Lua. Está igualmente escolhida a Blue Origin para construir módulo lunar da futura missão Artemis V.
Está igualmente tudo a postos para começar o serviço de entregas na Lua da NASA, que irá estrear com a missão Peregrine Lunar Lander, num lançamento no próximo dia 8 de janeiro, que chegou a estar previsto para concorrer com o Pai Natal e o seu trenó a 24 de dezembro.
Clique nas imagens para mais detalhes sobre a missão
Com um destino um pouco mais longínquo em mente, a SpaceX continua a testar o foguetão mais poderoso do mundo até à data e respetiva nave espacial a que o mesmo dá boleia. Super Heavy e a Starship voaram pela primeira vez em abril deste ano, mas aquela que seria a estreia do sistema espacial terminou minutos após o lançamento, quando uma anomalia causou a destruição do foguetão e da nave no ar.
Em novembro, o superfoguetão tentou mais uma viagem. O sistema ligou os seus 33 motores para voar de novo, “arrancou” bem, mas acabou por explodir com cerca de nove minutos de voo, a 148 quilómetros de altitude, enquanto voava a 24.124 km/h.
Clique para ver as imagens do lançamento com mais detalhe
Teve tempo, no entanto, para entrar em órbita, para a separação dos dois estágios do sistema e para o segundo estágio ainda conseguir seguir viagem por uns minutos, num avanço considerável face ao que tinha acontecido com o teste anterior.
Veja o vídeo do momento, publicado pela SpaceX - que no final das contas, considerou a experiência como prova superada (no geral).
E é entre a Lua e Marte, com estrelas, asteroides, buracos negros e exoplanetas pelo meio que o sonho da exploração do Espaço e da descoberta dos segredos do universo continua.
Nada melhor para retratar todo o fascínio e atração cósmica existente que um “punhado” de imagens captadas por quem já tem muitos anos a “virar frangos”: o velhinho telescópio Hubble - que continua a mostrar que está aí para as curvas.
Este artigo faz parte do Especial de análise das notícias e tendências de 2023 no mundo da tecnologia. Acompanhe ao longo da semana os artigos publicados pela equipa do SAPO TEK e a opinião exclusiva de especialistas do sector.
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