A cada ano, mais resultados vão aparecendo, à medida que o alcance tecnológico (e financeiro) permite chegar mais longe na exploração do Espaço e, consequentemente, mais perto de desvendar os seus segredos.
Na última década o número de feitos e conquistas espaciais aumentou de forma considerável, mas também é verdade que o número de “intervenientes” cresceu igualmente, contribuindo para as maiores probabilidades de sucesso.
Os tradicionais “dinossauros” NASA, ESA ou Roscosmos têm agora a companhia de agências públicas mais recentes, como é o caso da agência espacial portuguesa Space Portugal, criada em março deste ano. E a par das apostas governamentais (ou da falta delas), surgiu a aposta privada com protagonistas como a SpaceX de Elon Musk, a Blue Origin de Jeff Bezos ou mesmo a Virgin Galactic de Richard Branson.
“A maior conquista desta década é que o Espaço é cada vez mais reconhecido como algo de bom para a Sociedade e para a Economia”, Chiara Manfletti, presidente da Space Portugal
O verdadeiro arranque dos voos espaciais comerciais foi um dos assuntos que marcou a década que está prestes a terminar, mas há mesmo muitas outras conquistas e descobertas para recordar, como vai perceber nos próximos parágrafos.
Tweets, alfaces e namoros entre sondas e cometas
Fora a possibilidade de enviar tweets a partir do Espaço, logo em janeiro de 2010, pode dizer-se que a década começou marcada por aquilo que parecia uma má notícia: a reforma dos vaivéns da NASA num contexto de cortes orçamentais, no verão de 2011. Mas foi “à boleia” da decisão do governo norte-americano que a era dos voos espaciais comerciais teve início.
Menos de um ano depois, a SpaceX - que hoje dispensa apresentações, mas em maio de 2012 ainda necessitava delas - lançava com sucesso o seu primeiro foguetão privado com o objetivo de reabastecer a Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla original).
Em julho seguinte o supertelescópio Hubble identificava a quinta lua de Plutão e a 6 de agosto de 2012, às 6h31 de Lisboa, o rover Curiosity aterrava, sem problemas, na superfície de Marte. Uns dias depois, o mundo da exploração espacial ficava mais pobre, com a morte de Neil Armstrong, o primeiro Homem a pisar a Lua.
Ainda nesse mesmo mês, a sonda Voyager 1 atingia espaço o espaço interestelar, arrecadando o título de primeiro objeto feito pelo homem a sair do sistema solar. A “gémea” Voyager 2 seguia-lhe os passos seis anos depois. Juntas são conhecidas como a missão espacial da NASA mais longa de sempre, tendo entrado nos “entas” em 2017.
As novidades espaciais reapareceram na forma de promessa no final de 2013: a NASA começou a produzir alfaces na Estação Espacial Internacional – que viriam a ser consumidas oficialmente pela primeira cerca de um ano e meio depois.
As sementes de alface romana já tinham dado os seus primeiros “frutos” entretanto, mas na altura a totalidade das plantas foi congelada e enviada para o planeta Terra, para ser analisada quanto à existência de componentes nocivos para os humanos, nomeadamente bactérias.
O final de 2013 também ficou marcado pelo lançamento do satélite Gaia, da ESA, com a missão de recolher os dados mais precisos até à data sobre a posição das estrelas na Via Láctea, que contou com a colaboração de equipas de investigadores portugueses no seu desenvolvimento.
Uns anos depois, os dados recolhidos pela missão davam origem ao maior catálogo de estrelas da Via Láctea, até à data, mais precisamente 1.700 milhões, representadas com a sua posição exata e brilho, entre outros dados, que pretendem contribuir para a elaboração de um rigoroso mapa sobre a origem e evolução da nossa galáxia.
Passados quase 10 anos do seu lançamento, e depois de uns tantos a hibernar, a sonda-mãe Rosetta despertava em janeiro de 2014 para continuar o seu “namoro” com o cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko. Antes de enviar o módulo Philae já tinha contado à equipa que o seu “eleito” cheirava a ovos podres, a estábulos e a vinagre.
O ansiado “contacto físico” aconteceu a 12 de novembro por volta das 16h00 em Lisboa, mas nem tudo correu como esperado. O sistema de fixação ao corpo celeste não funcionou e o módulo foi parar a um local diferente do estipulado, ficando numa parte do cometa que não recebia luz solar suficiente para recarregar as suas baterias.
Desta forma, Philae acabou por "adormecer", com a esperança por parte da ESA e, com certeza, do resto da comunidade científica, que quando o 67P estivesse no ponto mais próximo do sol, a pequena sonda pudesse regressar à vida.
Nas poucas horas em que esteve ativa na superfície do cometa, Philae acabou por conseguir recolher dados valiosos e enviá-los para Terra. E quando a comunidade científica já quase tinha perdido a esperança, “acordou” e enviou mais uns tantos, mas a alegria da equipa acabou durar pouco: o módulo tinha adormecido para sempre.
Mesmo sem o final feliz merecido, o que é facto é que a Rosetta ficou para a História como a primeira missão de sempre a “perseguir” um cometa, a estudá-lo bem de perto e a tocar nele. Além do grande feito de engenharia, foi também uma grande conquista para a investigação no geral.
Reutilizar foguetões e ter Marte e novos exoplanetas no horizonte
A segunda metade da década 2010-2019 começou marcada pela “saga” de tentativas de recuperação de foguetões para futura reutilização, com a intenção de dar início a toda uma nova era espacial “mais em conta”.
Depois de numa primeira tentativa em que um foguetão quase aterrou numa plataforma no meio do mar, mas acabou por se despenhar, à segunda a SpaceX não conseguiu fazer muito melhor, com o rocket a afundar-se no oceano. E nem à terceira foi de vez. Mas a cada tentativa que passava o objetivo da empresa em ter foguetões reutilizáveis ficava mais próximo.
A tentativa seguinte, a 28 de junho de 2015, correu mal logo no lançamento, com a explosão a acontecer apenas 139 segundos após o Falcon 9 ter deixado de tocar o solo.
No fim de tudo, a Blue Origin acabou por roubar o protagonismo à SpaceX e foi a primeira a conseguir recuperar um foguetão espacial, depois deste ter estado a 100 quilómetros do solo terrestre. A empresa de Elon Musk conseguiria o mesmo feito, cerca de um mês depois.
E depois das alfaces, 2016 começou com a notícia de que também há flores a bordo da Estação Espacial Internacional, mais precisamente zínias. As primeiras da história plantadas e criadas no espaço.
“Um dia o sol vai explodir, antes de consumir toda a sua energia, e a humanidade terá que procurar outro lugar para viver. Embora esse dia ainda esteja longe - 5 mil milhões de anos, mais coisa menos coisa -, faz sentido pensar no assunto”, Carlos Cerqueira, diretor do ESA BIC Portugal
Pelo lado menos positivo, o ano ficou marcado pelo fim trágico do apaixonante “namoro” de longo prazo da sonda Rosetta com um asteroide. Passavam cerca de 40 minutos do meio-dia do dia 30 de setembro quando o gráfico de atividade da Rosetta, mostrado nos ecrãs da central de comando da ESA parou. Para a história ficam 12 anos com muita ciência para contar.
A Rosetta não foi o único revés para a ESA. As coisas também não correram bem com a Schiaparelli. A cápsula espacial destinada a Marte separou-se da sonda-mãe principal no dia 16 de outubro e devia ter pousado em solo marciano quatro dias depois.
Depois de pousar, a intenção era que pudesse usar os instrumentos "meteorológicos" de que ia munida para medir elementos como a velocidade e a direção do vento, a humidade, a pressão, a temperatura e também os campos elétricos da atmosfera marciana.
De qualquer forma, este acabou por ser apenas um percalço, já que a outra parte da missão, que compreendia pôr a sonda-mãe, TGO, em órbita, foi conseguida com sucesso total.
Paralelamente, outras missões espaciais começaram “à seria” e continuam lá longe a cumprirem os seus objetivos. É o caso da Juno que anda a ajudar a revelar os segredos do Universo, mais especificamente sobre Júpiter. Depois de cinco anos de viagem, a sonda encontrou-se com o gigante gasoso no início de julho de 2016 e, passados poucos dias enviava a primeira foto.
No mês seguinte completava o seu primeiro voo rasante sobre o maior planeta do Sistema Solar, na primeira de 36 viagens orbitais de grande proximidade programadas. Embora cumprindo condignamente os seus objetivos, chegou a pregar uns sustos à sua equipa, principalmente quando decidiu tirar uma sesta enquanto estava “de serviço”.
A New Horizons foi outra das sondas que continuou “perdida” no Espaço, salvo seja. A missão foi lançada em 2006 com a intenção de estudar Plutão e as suas luas. Em julho de 2015 atingiu o auge, quando a sonda se aproximou do planeta e recolheu as imagens mais detalhadas alguma vez capturadas. A informação recolhida nessa altura vinha chegando à Terra aos poucos e só ficou concluída em outubro.
Relativamente às fotos, em dezembro de 2015 a NASA mostrou imagens de Plutão recolhidas no momento antes da aproximação máxima da sonda ao planeta, recebidas em setembro, que classificou como as melhores obtidas até à altura. Em janeiro deste ano mostrava fotos recebidas a 24 de dezembro de 2015.
Entretanto, foi apresentada uma proposta de primeira casa marciana, uma habitação que mostrava as possíveis condições de vida humana caso alguma vez esta se chegue a fixar no planeta vermelho.
Em 2016 os foguetões reutilizáveis continuaram a marcar a atualidade, com uns a nunca chegarem a saber o que isso é, ou porque não estão destinados a regressar ao Espaço ou porque, digamos, deixaram simplesmente “de ser” – mais precisamente explodiram no regresso ou mesmo sem nunca terem abandonado a plataforma de lançamento.
Engraçado foi ver a reação de Elon Musk, “patrão” da SpaceX, em êxtase na primeira vez em que a empresa conseguiu aterrar um foguetão com sucesso, num vídeo divulgado recentemente.
2016 foi igualmente um ano que trouxe novos – ou revisitados – protagonistas, ou pelo menos “aspirantes a”. Foi o caso da China e da India. Destacamos ainda um outro momento marcante: o regresso à Terra de Scott Kelly, considerado o astronauta mais social de sempre, por ter iniciado todo um ritual de partilha do dia-a-dia de quem vive lá no alto, no Twitter e no Instagram, imagens da vista privilegiada a que tinha acesso incluídas.
Além de partilhar fotos, da missão de Scott Kelly ficou a saber-se que quem vai ao Espaço pode regressar mais alto e mais novo. Durante os 340 dias que passou a bordo da Estação Espacial Europeia Scott Kelly terá crescido duas polegadas, o equivalente a 5,08 centímetros. Isto porque na ausência de gravidade a coluna vertebral tem tendência para alongar-se.
Além de mais alto, o astronauta regressou mais novo e a justificação está relacionada com a teoria da relatividade de Einstein. De acordo com a mesma se dois objetos se movem a velocidades diferentes, o tempo passa mais depressa para o objeto mais lento - um fenómeno conhecido como dilatação do tempo.
A SpaceX voltou aos lançamentos logo no início de 2017, quando tinha terminado 2016 de forma "explosiva". Depois de uma primeira marcação, o regresso dos Falcon 9 “aos ares” deu-se em meados de janeiro.
No mês seguinte era a vez de uma das maiores descobertas do ano: numa constelação “vizinha”, existem sete planetas de dimensão semelhante à Terra, com condições para a existência de vida - ou talvez não. A equipa que fez a descoberta do TRAPPIST-1 integra uma astrofísica portuguesa. Passado pouco tempo, uma nova descoberta apontava uma para Super Terra com possibilidades de vida bem perto de nós.
Mesmo no final de março as atenções voltaram a virar-se para o visionário Elon Musk e para a sua SpaceX, que escreveu um novo capítulo na história da exploração espacial ao aterrar um foguetão já usado. Um Falcon 9 que já tinha sido utilizado em 2016 foi lançado e aterrado em segurança, num feito que garante a redução de custos nas (ainda) milionárias missões espaciais.
Em abril, e depois de quase 20 anos no Espaço e de ter brindado a comunidade científica com mais de 379 mil imagens e perto de 600 gigabytes de dados, a senhora dos anéis - e das luas - de Saturno Cassini iniciava o conjunto de “voos” que assinalaram o seu fim.
Enquanto se passeou pelo Espaço, a sonda “mergulhou”, “ouviu” e “fotografou” muito para fazer revelações que a NASA foi divulgando ao longo do tempo. Como a lua Pan de Saturno, que podia muito bem chamar-se Ravioli.
O ano de 2017 foi igualmente marcado pela intenção de “regressar” à Lua, com vários países, como a Rússia ou o Japão, ou empresas, como a Moon Express, a mostrarem essa vontade. O satélite natural também esteve em destaque por poder vir a servir de "trampolim" para outras paragens, como por exemplo Marte.
Entretanto, apresentam-se os novos fatos espaciais e planeia-se a construção do BFR - ou Big Fucking Rocket, com a sigla desdobrada -, a primeira nave espacial interplanetária da empresa.
Em fevereiro de 2028 acontecia o primeiro voo de um Falcon Heavy, um dos foguetões mais poderosos de sempre a chegar ao espaço. Nesta viagem de teste, a carga era simbólica. A bordo do "veículo" da SpaceX seguiu um velho modelo desportivo da Tesla, com Starman ao volante, Space Oddity, de David Bowie, como banda sonora e Marte no horizonte.
O planeta vermelho continuou como “fetiche espacial” de destaque em diversas ocasiões: ficámos a saber que há moléculas que podem provar a existência de vida, que pode existir um vasto lago de água salgada escondido sob uma camada de gelo no Polo Sul ou que o planeta vermelho pode ter oxigénio suficiente para suportar vida, mas ainda é impróprio para humanos. Tudo isto graças às missões que “acompanham” Marte. Curiosity, Opportunity e InSight são alguns dos “recursos”.
Também ficámos a conhecer a Mars Base Alpha, a primeira base humana em Marte idealizada pela SpaceX e a saber que a primeira criança extraterrestre pode nascer em 2024.
O planeta vermelho fechou 2018 com chave de ouro, quando a ESA decidiu dar a conhecer a cratera Korolev, um repositório de água gelada que persiste o ano inteiro no planeta vermelho e que mais parece uma pista de gelo.
A foto construída a partir de cinco "tiras" de imagens distintas, cada uma delas registada numa órbita diferente pela câmara de alta resolução, conhecida pela sigla HRSC, da Mars Express, correu e maravilhou o mundo.
Em 2018 marcaram-se regressos à Lua, pela importância que o satélite natural ainda pode ter na viagem até ao planeta vermelho, mas não só. O Sol também conseguiu alguma da luz dos holofotes para si, não pelas tempestades de outras alturas, mas porque uma sonda da NASA conseguiu e maior aproximação ao astro-rei de sempre até agora.
De entre tudo o que aconteceu relacionado com as “esferas mais além”, os aniversários redondos marcaram o 2018 acabado de passar. O maior de todos, os 60 anos da NASA, assinalados a 1 de outubro. Em seis décadas o papel da agência espacial norte-americana para alargar o nosso conhecimento da Terra, do sistema solar e do resto do universo é inegável.
Outro aniversário “de peso” foi o da ISS, que comemorou duas décadas. A data foi assinalada oficialmente pela NASA e pela ESA com um vídeo time lapse mais longo de sempre, feito do Espaço.
Na lista de “grandes aniversariantes”, assinalaram-se também os 20 anos do programa europeu de satélites de observação da Terra Copernicus e os 25 anos de lançamento do PoSAT-1, o primeiro satélite português.
O turismo espacial também ficou mais perto de acontecer: a SpaceX elegeu o primeiro turista para levar à Lua, a Virgin Galactic concluiu com sucesso os testes da sua nave espacial SpaceShipTwo, a Blue Origin anunciou que vai vender viagens ao espaço por 200 mil dólares e houve até quem aceitasse reservas para as férias de 2022, no hotel de luxo Aurora Station. A estadia custava a "modesta" tarifa de 9,5 milhões de dólares por 12 dias.
Contudo o ano de 2018 não passou sem alguns "sustos", nomeadamente um buraco na ISS e a possibilidade de a estação espacial ficar sem "hóspedes" pela primeira vez na sua existência, depois de uma falha no acelerador do foguetão que devia levar dois astronautas obrigar a uma aterragem de emergência. Mas tudo acabou por terminar bem, com a chegada de uma nova tripulação, desta vez numa viagem sem incidentes.
50 anos da chegada à Lua e a primeira foto de um buraco negro
Logo nos seus primeiros dias, 2019 teve a imagens de Ultima Thule, o objeto espacial mais distante do Sistema Solar que a humanidade já conseguiu alcançar, e do lado oculto da Lua, in loco.
A Lua voltou a estar em destaque, por mais do que um motivo: pela comemoração dos 50 anos da missão Apollo 11 que levou os primeiros humanos ao satélite natural da Terra e pelas promessas reforçadas de regresso, da NASA e também da ESA.
Mas o último ano da década ficou marcado por um mesmo muito grande acontecimento: a primeira fotografia da sombra de um buraco negro supermassivo. E depois da primeira imagem real, o astrofísico português Hugo Messias sugeriu, em entrevista ao TEK, que podem vir mais a caminho.
E por falar em caminho, depois dos adiamentos, o satélite explorador de exoplanetas Cheops seguiu o seu, enquanto a Parker Solar Probe continua a sua viagem de sete anos à volta do Sol e vai mostrando trabalho.
Entre os acontecimentos espaciais de 2019, não podemos deixar de fora descobertas como a existência de vapor de água na lua gelada de Júpiter, os possíveis indícios de vida nos géiseres da lua gelada de Saturno ou a possibilidade de haver água congelada a apenas 2,5cm abaixo da superfície marciana – embora por outro lado, a comunidade científica esteja longe de explicar o um padrão de comportamento do oxigénio no planet vermelho.
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